Animais Fantásticos e Onde Habitam – Retornando ao mundo bruxo de J.K. Rowling!
Animais Fantásticos e Onde Habitam – Retornando ao mundo bruxo de J.K. Rowling!
Depois de cinco anos de ansiosa espera entre os fãs, que achavam que nunca mais iam retornar ao universo fantástico de Harry Potter nos cinemas, Animais Fantásticos e Onde Habitam chegou às telonas brasileiras na última quinta-feira. E aqui, temos nossa opinião sobre o mais novo filme situado no mundo bruxo de J.K. Rowling!
Ficha Técnica
Título original: Fantastic Beasts and Where to Find Them
Duração: 133 minutos
Data de estreia: 17 de Novembro de 2016 (Brasil)
Direção: David Yates
Produção: David Heyman, J.K. Rowling, Steve Kloves, Lionel Wigram
Roteiro: J.K. Rowling
Elenco: Eddie Redmayne, Katherine Waterston, Alison Sudol, Dan Fogler, Ezra Miller, Jon Voight, Ron Perlman, Carmen Ejogo, Colin Farrell e Johnny Depp.
Newt Scamander é um magizoólogo que chega em Nova York com uma missão bem peculiar. Em sua jornada, ele acaba encontrando o aspirante a padeiro e não-maj (ou trouxa) Jacob Kowalski, e acidentalmente perde sua maleta repleta de animais mágicos.
Isso faz com que Tina Goldstein, uma ex-auror que deseja limpar um “erro” em sua carreira, passe a observar os dois, e ao lado de sua irmã Queenie, ajude Newt a cumprir sua missão, resgatar seus animais e poder restaurar o status quo. Porém, eles não percebem que isso atrai negativamente a atenção do MACUSA, o “Ministério da Magia” dos Estados Unidos, bem como uma organização não-maj disposta a eliminar os bruxos da América.
E enquanto tudo isso acontece, uma ameaça paira no horizonte, na forma de Gerardo Grindelwald, um bruxo das trevas poderosíssimo que está em uma constante jornada para ascender ao poder e fazer recair sobre o mundo seu reinado de terror, enquanto ele procura as lendárias Relíquias da Morte.
E assim temos início a mais um capítulo na história do mundo bruxo, criado por J.K. Rowling, em 1997, com o primeiro livro de uma saga que viria a se tornar um fenômeno global: Harry Potter e a Pedra Filosofal. Dessa vez, a história ruma ao passado, mais precisamente ao ano de 1926, quase setenta anos antes de Harry Tiago Potter ser convidado para a Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts. E tudo que os fãs da saga mais amam está presente aqui.
Agora, com roteiro da própria J.K. Rowling, o novo filme propõe-se a trazer uma trama mais adulta, sem deixar de lado o bom humor da franquia original e um respeito muito grande por seus personagens e universo.
O mundo bruxo, apesar de bem diferente do que conhecemos, ainda guarda lugar para muitos novos encantos e vale destacar o quanto o filme consegue traçar uma linha bem definida entre as diferenças das comunidades bruxas na Inglaterra e nos Estados Unidos. Somos bombardeados com um senso de urgência maior e uma tensão atenuada entre bruxos e não-majs, algo que não se sentia tanto em Harry Potter, especialmente considerando os não-majs (ou seja, pessoas sem habilidades mágicas) como um fonte de ameaça forte aos bruxos.
Do mesmo modo que em Harry Potter, o filme é carregado por aquilo que ele melhor apresenta: seus personagens. Através da atuação de Eddie Redmayne, Newt se torna uma pessoa gentil e adorável, disposto a tudo pela paixão pela sua profissão e os animais que ele trata. Dan Fogler imprime em Jacob Kowalski um forte bom humor, mas também funciona como o elemento humano na trama, permitindo ao público a perspectiva de alguém deslumbrado com a descoberta do mundo bruxo.
No elenco feminino, Katherine Waterston e Alison Sudol brilham no papel das irmãs Goldstein. Enquanto Tina é mais séria, centrada e prática, vemos em Queenie um ar sonhador, idealista e requintada, que transforma cada gesto de magia em um espetáculo à parte. Juntos, os quatro formam um núcleo bem definido e a história os segue, de modo que cada um deles tem funções bem demarcadas na narrativa, sem dar a impressão de que há algo faltando ou que um é menos desenvolvido que os outros embora, obviamente, Newt seja quem tome conta do desenrolar da história.
Não menos importante, o elenco coadjuvante serve para trazer peso e consistência, inserindo a tensão que só cresce até a eclosão do clímax. Dessa forma, Colin Farrell está confortável em um papel vilanesco e sem grandes nuances dramáticas, enquanto Ezra Miller dá tudo de si por um personagem que possui várias camadas. Destaque também para Samantha Morton, que traz uma personagem desprezível e com requintes de crueldade, que pode lembrar muitos fãs da temível professora Dolores Umbridge, de A Ordem da Fênix, embora em uma escala mais sóbria e séria.
Em termos técnicos, o filme deixa pouco a desejar. Um grandioso ponto positivo é a direção de arte, a construção de cenários e o figurino. Esses três fatores não apenas ajudam a trazer uma caracterização ainda mais fiel ao período histórico onde o filme se situa, como também cooperam para tornar o visual mais diversificado, variando do fúnebre, decadente e assustador ao eufórico, vívido e mágico. E com esse título, o que era de se esperar torna realidade: os animais tomam conta, com designs diferentes, que atribuem personalidade a cada criatura mágica. Destaque para o Occami e o Pelúcio que, com certeza, se tornará um favorito entre os fãs.
Além disso, a trilha sonora, que mistura notas memoráveis da trilha sonora da saga “original” e algo mais vibrante, como jazz e sinfonias mais inquietas, merece os louros por conseguir se desprender do universo pré-estabelecido, ao mesmo tempo em que cria um forte sentimento de nostalgia, que já deve atingir em cheio os fãs nos primeiros segundos de filme.
Mas tudo isso parece ofuscado quando se fala do roteiro do filme. Assinado pela própria Rowling, roteirista de primeira viagem, o script cativa o principal da história, inserindo aqui e acolá uma série de detalhes emblemáticos que apenas os fãs mais atentos da obra da autora irão notar.
Falando nesses elementos e detalhes, o filme acaba funcionando como uma grande plataforma de lançamento para suas continuações, que devem abordar um pouco mais da história política do mundo bruxo e a ascensão de Grindelwald enquanto Newt e seus aliados procuram por novas criaturas encantadas.
Porém, é curioso notar que, apesar de ser estruturado para apresentar suas continuações e deixar uma série de ganchos e lacunas que serão preenchidos ao longo dos próximos quatro filmes, Animais Fantásticos e Onde Habitam é uma aventura episódica. Ao final, a história toda parece ter sido resolvida, o que torna ainda mais convidativo retornar aos cinemas para as próximas aventuras.
E nesse ponto é que surge o apego pelos personagens, algo que Rowling sempre estabeleceu muito bem em sua obra. Enquanto Grindelwald será um mal necessário para o futuro, só podemos imaginar como teremos a reunião de Newt, Tina, Queenie e Jacob, além do papel crucial de Credence (Ezra Miller) nessa nova franquia.
O filme também traz um universo muito mais amadurecido, e como tal, busca se apoiar em questões mais complexas para abordar metáforas muito significativas na cultura atual. Toda a política do MACUSA funciona para demonstrar questões de abuso de autoridade.
Ao mesmo tempo, os Segundos Salemianos representam uma figura constante que serve de alegoria presente para um dos maiores problemas de nossa sociedade, principalmente nos últimos anos: a intolerância e o fundamentalismo de ideias.
Tudo isso ajuda a trazer mais consistência à narrativa, de modo que todos sabemos que trata-se da construção de um universo e não apenas uma aventura spin-off isolada, sem levar em conta a situação do mundo bruxo naquela época e lugar.
Todavia, apesar de acertar bem mais que errar, Animais Fantásticos e Onde Habitam ainda desliza em alguns detalhes que acabam impedindo o filme de chegar a sua total grandiosidade e forma completa. Ainda que a trama do filme toque em assuntos complexos e polêmicos, ela nunca passa da superfície. Uma trama política tão vasta acaba ficando rasa e sem grande retorno narrativo – inclusive, toda a relação entre a política não-maj e com os Segundos Salemianos não passa do óbvio e nem sequer chega a um final definido, o que nos deixa questionando a respeito da necessidade da subtrama no filme.
Mais desapontante que isso é a história secundária que envolve Gerardo Grindelwald. Polêmicas à parte sobre a escalação de Johnny Depp, o ator aparece pouco demais para se ter um veredito fixo sobre sua atuação, mas no que apresenta, não sai da zona de conforto do “esquisitão charmoso”, além de apresentar uma das piores caracterizações de toda a saga.
Outro ponto diz respeito ao papel de Percival Graves. Embora alguns fatores, posteriormente, sirvam como explicação para as motivações do personagem e seu papel na trama, em momento algum do filme o vilão – que diga-se de passagem, funciona até outra figura antagonista entrar em cena – aparenta ter um papel maior do que realmente lhe é apresentado, o que torna uma das reviravoltas finais menos impactante do que poderia ser.
Quanto à parte técnica do filme, alguns defeitos pequenos chamam a atenção. Apesar de ser um diretor que conhece o universo e a obra de Rowling, David Yates parece ligar o modo automático aqui. A fotografia é pouco inspirada, o que acaba não colaborando para fazer o visual do filme saltar aos olhos do público.
Além disso, nota-se um problema grave de edição e montagem, que rende algumas cenas confusas sobretudo no início do filme. A impressão que temos é que alguma versão estendida pode ajudar a trazer uma “narrativa bônus” que acabe ajudando a compreender melhor.
E por fim, embora os efeitos visuais sejam em sua maioria bons e acreditáveis, um ou outro acaba parecendo fabricado demais, com cenas onde o uso de tela verde se torna claro e acaba suspendendo a “realidade”. Porém, nada disso interfere de modo tão negativo na trama.
Num geral, Animais Fantásticos e Onde Habitam é um filme que aproveita do seu tom de nostalgia para compor sua própria história, com um universo sendo expandido aos olhos do fã mais voraz da saga ou do espectador leigo que ocasionalmente decidiu ver o filme por conhecer razoavelmente a franquia.
É difícil compará-lo a qualquer outro filme de Harry Potter, pois tratam-se de propostas diferentes que dificilmente cairão na mesma fórmula. Mas se essa nova empreitada revela algo é que o mundo bruxo continua mais vivo do que nunca, e que J.K. Rowling, mais do que ninguém, possui total domínio desse universo místico.
Em outras palavras, não apenas um ótimo filme com uma trama promissora, mas também um sentimento: a magia está de volta. E dessa vez, ela não deve nos abandonar tão cedo. Nox.
NOTA: 4