Review: Silent Hill 2 Remake te convida à uma experiência traumática perfeita

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Review: Silent Hill 2 Remake te convida à uma experiência traumática perfeita

Por Márcio Jangarélli

Nos meus sonhos inquietos, eu vejo aquela cidade…” A frase inicial da carta da Mary em Silent Hill 2 ressoou por anos com o sentimento dos fãs da icônica franquia da Konami. Por muito tempo, o público sonhou em voltar para Silent Hill, para vivenciar os piores pesadelos e desvendar as melhores histórias, mas sem sucesso.

Silent Hill 2 Remake, recriação do capítulo mais aclamado da saga, desenvolvido pela Bloober Team, vem, então, como um presente para o público e para a indústria gamer. A Legião recebeu uma cópia do game para review e, depois de experimentar os terrores dessa pacata cidade do Maine, descobrimos que um conto fantástico de horror pode funcionar até melhor na segunda vez. Vamos juntos para Silent Hill?

Ficha Técnica

Título: Silent Hill 2 Remake

 

Data de lançamento: 8 de outubro de 2024

 

Desenvolvedora: Bloober Team

 

Distribuição: Konami

 

Plataforma: PlayStation 5 e PC

 

Modo: Single player

 

Gêneros: Survival Horror

 

Tradução PT/BR: Sim

Atmosférico, medonho e catártico

Um fenômeno singular às vezes surge no universo gamer, quando um título muito amado, que impactou toda uma época e a própria indústria, recebe uma atualização ou refação boa o suficiente que consegue agradar os fãs mais ferrenhos, novatos e críticos. Aconteceu em 2020 com Final Fantasy VII Remake, por exemplo, e perdurou em FFVII Rebirth, neste ano. Porém, nesse caso já haviam bons agouros circulando. Silent Hill 2 Remake, por sua vez, lançado em outubro de 2024, carregava consigo a mais potente aura de desastre. Felizmente, este lançamento não foi uma tragédia.

Desenvolvido pela Bloober Team, com o fardo homérico de reviver a icônica franquia de horror da Konami depois de sequências questionáveis, remasters mal feitos e muitos problemas internos, Silent Hill 2 Remake é uma refação ou reimaginação (dependendo de como você encara a história) fenomenal que consegue capturar a essência do título original e traduzi-la para uma nova experiência assombrosa. Se compararmos, é um feito tão impressionante quanto o de Resident Evil 2 Remake, de 2019 – ainda que este tenha navegado nos louros de RE VII e boa fama da Capcom, enquanto SH 2 nasceu de um histórico mais sombrio que a cidade título.

É cômico e metalinguístico que as principais preocupações dos fãs com o game derivem de traumas do que a franquia se tornou depois que saiu das mãos de seus desenvolvedores originais. Sem contar o currículo misto da Bloober Team, que até teve boas ideias em suas próprias IPs, mas nada com verdadeira substância. Assim, com os trailers iniciais, tudo parecia ser um mau sinal: “o jogo parece mais voltado para a ação”, “os novos designs não funcionam”, “parece uma cópia de Resident Evil 2”, entre outros tantos comentários surgiram e foram alimentados até a época de lançamento.

A questão é que, mesmo que o público tenha todo o direito, nesse caso, de ficar receoso (e essas reclamações provavelmente guiaram o desenvolvimento do game) é impossível recapturar o original de qualquer maneira. Não só isso: as mecânicas precisam ser atualizadas para o que o gênero de horror reconhece como gameplay comum hoje, além de mirar em fazer dinheiro o suficiente para reiniciar toda a franquia. Considerando tudo isso, Silent Hill 2 Remake foi bem sucedido em todos os aspectos.

Sim, o game se utiliza de alguns enquadramentos e mecânicas do revival da franquia “rival”, tem um pouco mais de ação incorporada em seu gameplay e atualizou muita coisa nas áreas de design de mundo, personagens e monstros. Nada disso se tornou um prejuízo para o jogo. Na verdade, todas as escolhas feitas na recriação de Silent Hill 2 funcionam brilhantemente, até mesmo melhorando o conceito original. É só ver como o combate, ainda que mais dinâmico e com mais opções, mantém o caráter vulnerável e violento, gerando um equilíbrio mais interessante entre gameplay divertido e restrições intencionais.

Também, o fato de que o remake diminui a “estranheza” em seus diálogos, integrando dublagens e interpretações fantásticas, cria uma nova experiência para fãs de longa data enquanto oferece uma porta acessível para novos jogadores. Nesse caso, devido aos gráficos e hiper-realismo, manter as dublagens insanas do original tornaria o jogo mais caricato do que ele deve ser. Em contrapartida, o original dependia desses diálogos para alimentar a imersão em sua realidade distorcida.

Mesmo sem parte dos elementos mais pitorescos, Silent Hill 2 Remake nunca te deixa questionar a estranheza desse universo. Por conta do quão reais os personagens se parecem agora, as situações em que eles se encontram, suas atitudes e expressões, ditam o tom surreal da história. Uma coisa é você assistir o James poligonal enfiar a mão em um buraco grotesco; a experiência é completamente outra quando ele se parece com uma pessoa de verdade ao se sujeitar às situações degradantes do game.

E o núcleo do que tornou Silent Hill um pilar do horror na cultura pop se mantém: a atmosfera opressiva, surreal, doentia, violenta. Aquele tipo de clima que prende seu interesse, mas gera repulsa. Tudo ao mesmo tempo. É quase como olhar para o abismo e se sentir inclinado a pular, mas sentir todos os seus nervos gritando para correr. O game respeita o tom da franquia e, quando não está renovando algumas peças, reinterpreta ou emula o que o Team Silent fazia de melhor.

A trilha e efeitos sonoros são personagens vivos no Remake assim como eram original. É uma das melhores composições dos últimos anos, se mantendo fiel a um dos elementos mais brilhantes da franquia Silent Hill. Claro, o icônico compositor e produtor Akira Yamaoka, um dos responsáveis pelos primeiros jogos da saga, retornou no Remake, então não dava para esperar menos. Sonoramente, Silent Hill 2 Remake é torturante e visceral, mas melancólico, suave e lindo, tudo equilibrado e alocado perfeitamente para pegar o jogador desprevenido e lançá-lo na espiral conflitante que o game oferece.

No quesito de gráficos, o jogo é tudo o que você poderia querer de Silent Hill em 2024. Detalhes como sangue e sujeira nas roupas e pele do seu personagem, microexpressões faciais ou como iluminação e sombras são trabalhadas demonstram qualidade absoluta, dedicação extrema e ponto de vista artístico aprimorado por parte equipe, elementos essenciais para reviver uma franquia tão aclamada e querida.

Claro, há alguns glitches e bugs, sejam pernas tremendo misteriosamente, movimentos travados de rosto fora de cutscenes ou texturas mais pobres. Além disso, a configuração do controle é estranha, com alocações peculiares do botão de mapa, inventário e “giro”, e, às vezes, o desvio do James gera uma hitbox inconstante. Talvez você passe um pouquinho de raiva girando sem querer ou rentando encontrando o mapa (e ria, também, se a perna do James começar com tremeliques) mas não são detalhes que realmente influenciam na jogabilidade ou qualidade.

No fim das contas, Silent Hill 2 Remake é o retorno triunfal, intenso e desolador de uma franquia que não merecia o tratamento que recebeu. É um presente para os fãs, uma homenagem ao horror de alta qualidade da indústria gamer e um título essencial para a nova geração, recapturando como narrativa, som, imagem e jogabilidade podem se mesclar de formas únicas na criação de uma experiência atemporal.

Duas décadas depois de The Room, finalmente uma vitória para os fanáticos por Silent Hill! Será que agora dá para criar esperanças pelo lançamento de Silent Hill f? Ou será que o acerto só aconteceu porque o material base já era icônico?

 

De qualquer forma, Silent Hill 2 Remake é mais do que poderíamos esperar: um retorno à qualidade do início da saga, mas recriado à nova maneira de fazer videogame. É desconcertante de maneiras diferentes, possui sua própria forma de entrar na cabeça do jogador, mas mantém e eleva uma história sem igual.

 

Assim, para a Legião, Silent Hill 2 Remake é um incrível 9,5. Um dos nossos jogos preferidos do ano que rendeu muitas horas de medo, tristeza, surtos de risada, ansiedade e catarse. 

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