Crítica – Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo frustra ao se acomodar na fama da franquia

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Crítica – Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo frustra ao se acomodar na fama da franquia

Por Gabriel Mattos

A Turminha cresceu. Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo marca o início de uma nova era nos cinemas para as histórias de Maurício de Sousa. Os filmes começam a adaptar a versão mais recente da personagem, deixando a inocência infantil de Turma da Mônica: Laços e Lições para explorar a incerteza da adolescência. Sem entrar no lado fantástico, esse aprofundamento dos personagens já renderia um roteiro interessante, mas não foi o que rolou. No final, Reflexos do Medo entrega uma aventura confusa com um problema sério para encontrar sua personalidade — que ainda assim pode entreter.

Ficha técnica

Título: Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo

 

Direção: Mauricio Eça

 

Roteiro: Sabrina Garcia, Rodrigo Goulart, Regina Negrini, Antônio Arruda, Victor Michels, Bruna Boeing e Tiago Cunha

 

Data de lançamento: 18 de janeiro de 2024

 

País de origem: Brasil

 

Duração: 1h 22min

 

Sinopse: Mônica, Cebola e sua turma estão animados para começar o Ensino Médio. Porém precisarão derrotar uma criatura misteriosa que começou a sequestrar inocentes na Rua do Limoeiro.

O que funciona em Reflexos do Medo?

Na trama, Mônica (Sophia Valverde) e sua turminha precisam impedir uma criatura paranormal muito antiga que está sequestrando seus colegas de escola. Para acabar com esta ameaça, o grupo começa a investigar as origens deste mistério. Por mais deslocado que possa soar, o lado enigmático da história funciona muito bem. O problema é exatamente a construção da própria Turma da Mônica.

O maior inimigo de Reflexos do Medo é seu roteiro. Sete pessoas foram envolvidas na elaboração da história final e isso fica bem aparente. A trama passa aquela sensação de um trabalho de escola em que cada um fez a sua parte e depois decidiu reunir tudo sem se atentar a coesão. Assim, mesmo que existam pontos muito positivos na história, estes acabam não tendo espaço para brilhar porque o filme não consegue construir uma base sólida para isso.

O vilão, Cabeça de Balde, é um exemplo destes momentos de brilhantismo. As cenas em que o monstro faz suas vítimas seguem um formato muito parecido com clássicos do terror slasher, como Pânico. Porém há uma preocupação em adaptar a linguagem do gênero para algo mais condizente com o público infantojuvenil, muito claro pela troca do sangue cenográfico por luzes paranormais. Ainda assim, a direção consegue instaurar um clima de tensão e estabelecer o vilão como uma ameaça a se preocupar.

A história entra nos eixos enquanto Cabeça de Balde é o centro das atenções, o que acontece ao longo do segundo ato do roteiro. Inspirado em um personagem da turminha clássica, o longa consegue conectar, de forma bastante orgânica, sua origem na mitologia mesoamericana com o passado de Cascão, os novos poderes de Magali e o legado da família da Milena. Assim, durante o tempo em que os holofotes estão na caça ao vilão, tudo flui com uma naturalidade absurda. O ritmo engata de uma forma surpreendente e avança o desenvolvimento de metade do elenco principal de forma espontânea.

A própria caçada para descobrir pistas é empolgante. De certa maneira, desperta um sentimento muito familiar de acompanhar um agradável episódio de Scooby-Doo. Os heróis investigam algum cenário relacionado ao monstro, escapam de um ataque sobrenatural e saem cada vez mais perto de desvendar o mistério. Para este lado místico, o roteiro não tem vergonha de se apropriar de fórmulas testadas e aprovadas por outras produções — o que não é um problema.

Encontrar inspiração em clássicos do cinema pode fortalecer uma obra, quando feito da fórmula certa. E, de certo modo, é o motivo pelo qual o meio do filme funciona muito bem. A grande questão é porque a mesma estratégia não foi usada para tentar salvar o início e o final, que não conseguem construir a mínima profundidade.

O que tem de errado com Turma da Mônica Jovem: Reflexos do Medo?

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Sem entrar em spoilers, mas a conclusão do filme aposta na força das relações dos personagens para justificar seu desfecho — algo até esperado em um filme infantojuvenil. O problema é que: para isto funcionar nos momentos finais do longa, deveria ter acontecido uma construção sólida destes relacionamentos no começo — o que não acontece. Turma da Mônica: Reflexos do Medo confia na fama da franquia para ousar uma quebra das regras básicas do cinema sem um grande motivo. E o tiro sai pela culatra.

Tradicionalmente, na primeira meia hora de um filme, o que chamamos de primeiro ato, o roteiro faz um esforço para desenvolver bem seus personagens. Afinal, com a personalidade do elenco bem estabelecida é possível explorar cada vez mais facetas dos personagens conforme a história avança sem precisar explicar tudo novamente ao público. Contudo, em Reflexos do Medo, isso simplesmente não acontece. Os minutos iniciais da história são completamente desperdiçados.

 

Todos os personagens passaram por uma mudança muito drástica desde a sua última aparição em Turma da Mônica: A Série (2022). Não apenas por conta da troca completa dos próprios atores que interpretam a turminha, mas principalmente no quesito personalidade. A forma clássica como os personagens funcionam, que todo mundo conhece dos gibis originais, passou por um considerável amadurecimento para fazer sentido com a idade da turma. 

Quando Turma da Mônica Jovem chegou às bancas pela primeira vez, em 2008, a preocupação em fazer o público entender as mudanças na turminha foi tão grande que uma revista gratuita foi distribuída só para estabelecer a nova personalidade de cada membro: com a história “Eu Cresci”. E apesar de um filme não poder se dar ao luxo de lançar um curta com o mesmo propósito, a reintrodução deveria ter sido melhor integrada na história. Em um longa que bebe na fonte de tantos subgêneros do cinema internacional, não faz sentido não ter incorporado técnicas de histórias “coming of age”, que lidam com o amadurecimento para a adolescência, para trazer uma base mais sólida para o filme.

Uma introdução atrapalhada mexe com toda a estrutura do filme: desestabiliza o ritmo, torna a trama confusa, enfraquece os personagens… Este último ponto é um luxo que um filme que tem atores não-profissionais  no elenco, como YouTubers, não pode se dar. Muitos personagens interpretados por novatos acabam soando engessados muito por culpa de diálogos fracos e um roteiro raso. Talvez fosse o caso de reforçar a equipe de preparação de elenco, porque até mesmo veteranos, como Mateus Solano, acabaram sendo prejudicados e entregam uma atuação sem brilho.

 

Nem mesmo a turminha principal conseguiu escapar. Mônica e Cebola estão em suas versões menos carismáticas da história da franquia. Sophia Valverde e Xande Valois sofrem para encontrar algo interessante para mostrar para o público. 

Além de otimista e impulsiva, não existem muitas outras características que definem a Mônica. Existe até uma tentativa de acusá-la de ter problemas para controlar o temperamento: que vem do nada e vai para lugar nenhum. Cebola consegue ser até pior — a única coisa que lhe define é o seu interesse romântico por Mônica. Valois sequer tem o que fazer em cena quando seu amor pela amiga não entra em questão. Os atores, de fato, não tinham muito com o que trabalhar.

Mas, mesmo com migalhas, Bianca Paiva e Theo Salomão conseguem fazer um banquete. Graças a conexão de ambos com o vilão principal, seus personagens tem muito mais camadas e relevância para a história. Ambos atores conseguem explorar muito bem a situação para fazer o seu carisma ser percebido pelo público. Tanto Bianca quanto Theo dominam todas as cenas em que estão presentes, construindo uma química com quem quer que a sequência exija. A dupla entrega suas falas com tamanha convicção que é impossível discordar que são mesmo Magali e Cascão, mesmo sem uma introdução muito confiante.

Carol Roberto, apesar de ter menos tempo de tela que merecia, impõe uma segurança que casa perfeitamente com a Milena. Consegue chamar atenção nos poucos momentos que têm algum destaque, assim como a Denise de Carol Amaral e a Carmem de Giovanna Chaves

Mesmo que a fotografia do filme lembre muito os antigos filmes live-action do Cartoon Network, como o tenebroso Ben 10: A Corrida Contra o Tempo, a caracterização dos personagens é bastante competente. Dá para perdoar também os efeitos visuais sofridos, por conta dos cenários caprichados, que incorporam referências de histórias famosas da turminha, como O Caderno do Riso. Apesar deste constante cabo de guerra, entre entregar algo bem feito e de qualidade questionável, é possível sentir o amor de parte da equipe por este projeto. Pena que isso não seja o suficiente para transformar Reflexos do Medo no filme que os fãs da Turma da Mônica Jovem mereciam.

Para os pequenos, que cresceram lendo as histórias de Turma da Mônica Jovem, Reflexos do Medo ao menos entretém. Esta é uma história que, apesar de não chegar a lugar algum, sabe conduzir sua ação para entreter o público por tempo o suficiente para esquecer suas falhas. E com a atuação carismática de Bianca Paiva e Theo Salomão, fica mais fácil de encarar o roteiro raso e pouco inspirado. Mas apenas quem tiver coragem de encarar uma hora e meia completamente esquecível.