Crítica – John Wick 4: Baba Yaga é o filme definitivo da franquia estrelada por Keanu Reeves
Crítica – John Wick 4: Baba Yaga é o filme definitivo da franquia estrelada por Keanu Reeves
Keanu Reeves retorna como o famoso assassino de aluguel em uma trama ainda mais explosiva, impressionante e grandiosa
Existe uma beleza no universo quase místico de John Wick que é como se estivéssemos assistindo a uma peça de ballet clássico nos moldes de O Lago dos Cisnes. É como se toda a intensidade da famosa composição de Tchaikovsky e a busca pela perfeição representada na coreografia dos bailarinos se chocassem do jeito mais arrebatador possível para nos entregar sequências que te deixam sem fôlego por alguns bons minutos. No caso de John Wick 4: Baba Yaga, é exatamente essa sensação que temos ao longo de quase três horas de duração.
Dando sequência a uma das franquias de ação mais impressionantes dos últimos tempos, o diretor Chad Stahelski retorna mais uma vez para comandar um novo capítulo da história de John Wick. O diferencial é que Baba Yaga consegue usar toda a ambiguidade por trás da figura mitológica que apelida o assassino para entregar o filme definitivo da franquia, reunindo em apenas uma única e ambiciosa coreografia aquilo que faz Keanu Reeves transcender na frente das câmeras.
Ficha técnica
Título: John Wick 4 – Baba Yaga
Direção: Chad Stahelski
Roteiro: Shay Hatten e Michael Finch
Data de lançamento: 23 de março de 2023
País de origem: Estados Unidos da América
Duração: 2h 49min
Sinopse: Com o preço por sua cabeça cada vez maior, o lendário assassino de aluguel John Wick leva sua luta contra a Alta Cúpula ao nível global, enquanto procura os jogadores mais poderosos do submundo, de Nova York a Paris, do Japão a Berlim.
Em busca de vingança e liberdade
Assim como Keanu Reeves, John Wick é um homem de poucas palavras. Não espere reflexões profundas vindas da boca do assassino de aluguel que intitula a franquia: ele provavelmente vai agir primeiro e perguntar depois (ou nem perguntar). Tem sido assim desde o primeiro filme, lançado em 2014, e que apresentou ao mundo um ser humano fragilizado pelo luto e aprisionado por sua sede de vingança.
Muita coisa aconteceu desde o momento em que Wick saiu de sua “aposentadoria” até sua cabeça se tornar um prêmio diante de um mundo repleto de assassinos perigosos. Mas os dramáticos eventos finais de Parabellum funcionaram como uma última faísca que faltava para que John resolvesse tomar medidas ainda mais drásticas.
Em John Wick 4: Baba Yaga, acompanhamos Keanu Reeves levando o Bicho-Papão assassino para uma luta global contra a Alta Cúpula, a entidade poderosa que comanda todas as marionetes desse universo alucinante. Mais do que se preocupar com uma ameaça qualquer, John Wick agora precisa enfrentar chefões prepotentes e que, dificilmente, perdem uma partida nesse complicado jogo de tabuleiro. Tudo isso fora de Nova York, já que, para concluir sua vingança e conquistar (de novo) sua liberdade, o Baba Yaga tem que substituir o território familiar por uma empreitada de nível internacional.
Seguindo o ponto de vista de John Wick, somos catapultados para uma nova jornada nesse mundo complexo e cheio de regras que clamam pela ordem. O Continental, por exemplo, é basicamente uma incorporação dessa realidade quase alternativa – e que parece ter saído de obras como Deuses Americanos de Neil Gaiman. Os personagens de Ian McShane e Lance Reddick (que juntos protagonizam uma das cenas mais emocionantes do filme, principalmente após a triste morte do intérprete de Charon) são ótimos representantes dessa atmosfera intrigante e demasiadamente simples que já conseguiu atingir o mesmo patamar de grandes expoentes do gênero, como Missão Impossível.
É interessante ver como histórias centradas na ação sempre acabam encontrando novas formas de se reinventarem ao longo dos anos. Tom Cruise vem fazendo isso há décadas, basta olhar como Top Gun: Maverick conseguiu se destacar em 2022. Mas o que diferencia John Wick de seus semelhantes é a maneira como a saga comandada por Chad Stahelski parece usar a linguagem corporal como a grande motivadora da ação em si.
Indo além de propósitos pessoais dos personagens, o que importa no momento do “tudo ou nada” é explorar as movimentações corporais para entregar sequências de ação ritmadas. O que interessa de verdade é a dança da ação, e é isso que faz John Wick ser aquilo que ele é: brutal, eficiente e extremamente preciso. Em um lugar onde cada dançarino tem suas posições marcadas, é o ritmo da música que vai ditando os passos na pista.
Logo, seja nos momentos em que John Wick precisa resgatar o fôlego para recarregar uma arma ou nas intensas lutas corpo a corpo, cada enquadramento e cada movimentação da câmera converge propositalmente na construção de sequências insanamente bem coreografadas e ricas em detalhes. Isso já vem sendo feito na franquia desde o primeiro filme e é, certamente, uma marca registrada dela, mas foi Baba Yaga quem conseguiu atingir o ápice de uma excelente execução cenográfica. Talvez pareça ser algo exagerado à primeira vista, mas é exatamente isso que funciona no universo da saga.
Chega até a ser engraçado ver como tudo é tão ridiculamente impressionante. Beira à incredulidade quase, além de gerar um tremendo respeito pela equipe que conseguiu transformar uma briga entre dois assassinos na coisa mais elegante que você já viu na vida. As cenas em Osaka, que contam com a participação magnífica de Hiroyuki Sanada, e as de Paris – principalmente as da capital da França, veja bem – são um resumo de tudo aquilo que consolidou a franquia em Hollywood até agora.
A liberdade guiando o povo
Além de continuar expandindo a mitologia que serve como base para a franquia, Baba Yaga é excelente em tudo que se propõe a fazer. Com o roteiro de Shay Hatten e Michael Finch em mãos, o diretor Chad Stahelski faz mágica do começo ao fim, um comprometimento fundamental já que estamos falando de uma saga que não tem medo de ser ambiciosa quando planeja suas sequências mais enérgicas. É praticamente um “Tom Cruise pulando de um precipício em cima de uma motocicleta” atrás do outro.
Em meio à intensidade das luzes neon e das sequências de ação que ressaltam o poder de uma boa coreografia, o grande conflito de John Wick ganha ares mais definitivos no quarto filme. Muito disso vem da presença irritante do Marquês de Gramont (Bill Skarsgård), que faz tudo que está a seu alcance para dar um fim na vida do Baba Yaga. A performance de Skarsgård, que mais do que ninguém sabe como é interpretar figuras perturbadoras, foi precisa ao mostrar toda a megalomania contida no personagem, do começo ao fim.
No entanto, se houvesse um prêmio para consagrar a dinâmica mais emocionante de John Wick 4: Baba Yaga, ele com certeza iria para a dupla John Wick e Caine, um assassino que é brilhantemente interpretado por Donnie Yen. Com motivações bem definidas e uma extrema eloquência em cena, o personagem de Yen é um dos maiores méritos do quarto capítulo, especialmente por causa da vasta experiência da estrela de O Grande Mestre.
Embora pareçam estar em lados diferentes da mesma equação, as jornadas de Caine e Wick são mais parecidas do que aparentam ser. E por mais que Keanu Reeves seja a força motivadora da franquia, é lindo ver como Stahelski conseguiu extrair o melhor de cada personagem secundário do quarto filme, dando espaço para cada um brilhar em cena à sua própria maneira.
Assim, Caine até pode ser o que mais se destaca entre eles, mas o já citado Hiroyuki Sanada e a Akira de Rina Sawayama, por exemplo, também reforçam a importância que essas figuras possuem na narrativa. O curioso “Ninguém” de Shamier Anderson é outro elemento da trama que, certamente, contribui e muito para o sucesso do quarto capítulo.
Divertido, eletrizante e ousado: John Wick 4 é a perfeita combinação de tudo aquilo que fez a franquia se tornar uma grande representante do gênero de ação nos dias de hoje. A sensação, a cada novo filme da saga, é que Keanu Reeves poderia facilmente continuar por anos a fio estrelando sequências de luta que mais parecem uma complexa coreografia de ballet clássico do que o que de fato são. Mas não seria a transformação do “amável marido” John Wick em um assassino impetuoso a própria Odette aprisionada no corpo de um cisne?
É difícil não simpatizar com a jornada do Baba Yaga depois de tudo que ele enfrentou até aqui. Assim como Wick, tudo que queremos é ver sua vingança acontecer para que, finalmente, a tão desejada liberdade seja concedida. Keanu Reeves consegue captar tudo isso e mais um pouco sem dizer muita coisa, e é por isso que ele é tão preciso quando demonstra os conflitos de um homem devastado pelo luto, em todas as esferas de sua vida.
No final das contas, John Wick 4 dialoga bastante com a nossa própria noção de liberdade, e isso fica evidente quando, em determinado momento do filme, o Marquês de Gramont está diante do quadro A Liberdade guiando o povo, de Eugène Delacroix. É claro que, para o personagem de Bill Skarsgård, o conceito de liberdade é diferente daquele que John Wick busca incessantemente alcançar durante sua jornada. Mas isso não deixa de mostrar como é essa busca pelo “ser livre” que impulsiona a nossa vida para frente, independente de qual seja o resultado.
John Wick 4: Baba Yaga está em cartaz nos cinemas brasileiros.
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