Berserk: Uma das maiores obras do gênero seinen, por Kentaro Miura

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Berserk: Uma das maiores obras do gênero seinen, por Kentaro Miura

Por Flávia Pedro

Berserk é um mangá criado por Kentaro Miura e ficou muito conhecido dentro do gênero seinen (voltado para o público mais maduro) como uma obra prima do dark fantasy, mesmo estando inacabada. Infelizmente, Miura faleceu em 2021 antes de concluir sua tão aclamada obra. Porém, seu legado atravessa gerações e ainda existe muito o que se explorar e compartilhar dentro do grandioso universo criado por ele.

Hoje vamos nos aprofundar na história de Guts, o Espadachim Negro, para você que ainda não leu o mangá possa se familiarizar com a trama e, você que acompanha a jornada desse personagem, possa relembrar da genealidade de seu mangaká.

Afinal, sobre o que é Berserk?

Guts, o Espadachim Negro

Apesar de superficialmente Berserk ser uma história sobre vingança, as nuances da obra trazem aspectos e elementos muito mais amplos e sombrios que isso. Berserk também é uma história sobre traumas, solidão, desespero, medo, angústia e o contínuo sentimento de não ser forte o suficiente para proteger quem se ama. Conhecemos todos esses sentimentos com Guts, nosso protagonista, que leva uma vida difícil desde seu nascimento, quando foi encontrado ainda bebê por um grupo de mercenários, abaixo do cadáver de sua mãe.

Logo criança, Guts conhece a solidão – por ser uma criança em meio a criminosos – e perde toda a sua infância tentando se tornar um mercenário como Gambino (seu “pai” adotivo). O medo e o sentimento de impotência também surgem nessa fase, após sofrer um abuso que o traumatiza e causa danos irreparáveis ao seu psicológico. Guts então parte sozinho após matar acidentalmente a única figura que considerava sua família, o Gambino. Novamente o garoto encontra a solidão, dessa vez já adolescente.

O jovem mercenário solitário finalmente conhece e se une ao Bando do Falcão, liderado por um homem chamado Griffith. Ao finalmente deixar a solidão de lado, Guts passa a ver o Bando como sua família, comemorando juntos cada vitória e estando disposto a dar sua própria vida para proteger seus amigos. Ele também se apaixona pela guerreira Caska e parece que tudo está finalmente dando certo em sua vida, mas novamente tudo desmorona para o protagonista…

A queda de Griffith, a mudança na vida do Bando do Falcão e claro, o Eclipse. Medo, desespero, angústia e impotência, tudo em um único evento traumático que levou de Guts tudo o que ele conseguiu amar e o deixou, novamente, sozinho. Só depois de tudo isso nós entramos em uma trama de vingança, em que Guts se torna o Espadachim Negro e deseja matar Griffith, enquanto sobrevive no mundo sobrenatural repleto de seres monstruosos que querem fazê-lo de sacrifício.

O Eclipse

O Eclipse

 

Esse com certeza é um dos momentos mais traumáticos já criados dentro dos mangás e, mesmo sendo adaptado nas diversas versões do anime, nenhuma delas chega perto do quão aterrorizante é cada quadro desenhado por Miura. No Eclipse, Griffith está muito debilitado após meses de tortura e ele claramente nunca mais voltaria a ter sua forma física de antes. Isso o levou a desejar a morte e, prestes a cometer suicídio, ele encontra o amuleto que sempre carregou: o Behelit, ou o Ovo do Rei.

Descobrimos então que este é um amuleto místico que pode levar as pessoas a uma “outra dimensão”, onde está a Mão de Deus (um grupo de divindades sinistras). Griffith acaba levando a si mesmo e todo o Bando do Falcão para essa dimensão sombria e decide sacrificar todos aqueles que um dia foram seus amigos para finalmente alcançar seu objetivo: ter poder. Assim, Griffith se torna Femto, o quinto membro da Mão de Deus.

Guts acompanha todo o evento macabro, tentando salvar Griffth e protegê-lo de sua própria escolha. Ao perceber que tudo aquilo só estava acontecendo por decisão de seu amigo, Guts parte para tentar proteger o Bando do Falcão, mas já é tarde demais e resta apenas Caska. Como todo sofrimento é pouco, Guts é obrigado a assistir Caska sendo abusada por Femto e os demais demônios, até que o Eclipse chega ao fim e apenas os dois sobrevivem.

O Pós- Eclipse

Griffith e Guts, a dualidade da obra de Miura em dois personagens

Talvez aqui comece a parte mais difícil da vida de Guts… A sensação de impotência toma conta do personagem, o trauma de ver todos os seus amigos mortos é algo que o assombra e o principal: agora ele precisa lidar com Caska, que não é mais como ele conhecia. A mulher acabou enlouquecendo após vivenciar tudo aquilo e não o reconhece mais como o seu amor e parceiro.

Miura consegue expor todos os sentimentos e traumas deixados pelos eventos pesados com pequenas atitudes dos personagens, seja na forma como Caska está constantemente aérea e assustada, ou na decisão inicial de Guts em partir sozinho em busca de vingança, deixando quem ele mais amava para trás. Os personagens de Miura não são perfeitos e impecáveis, muito menos heróicos e tomam sempre a melhor decisão. Eles são, acima de tudo, humanos.

Até onde o sentimento de vingança de um homem é capaz de levá-lo, sem que antes ele priorize a segurança daqueles que ele protege? É realmente uma escolha fácil ter que decidir entre partir sozinho e deixar quem se ama em segurança, ou ser acompanhado de mais pessoas e colocar todos em perigo constante? Qual é a linha que separa o egoísmo da proteção nesse caso? São dilemas humanos que estão presentes em cada decisão de Guts, o que contribui para que seu fardo aumente, mesmo que ele conte com ajuda de mais pessoas. São nuances criadas por Miura, que ficam à sombra das grandes batalhas do Espadachim Negro e seus inimigos mosntruosos, mas sem isso não teríamos a genialidade e profundidade que dá fama a Berserk.

Por que o mangá nunca recebeu um anime à altura?

Essa é uma pergunta fácil de se responder, se olharmos com atenção o próprio mangá e cada um de seus quadros. Kentaro Miura é conhecido por ter sido um mangaká que faz cada página com uma riqueza de detalhes inconfundível, tornando sua história também uma obra de arte. Basta olhar qualquer quadro de um momento épico do mangá e notar a dedicação em sempre desenhar algo incrível. Veja um exemplo à seguir:

A icônica luta de Guts contra 100 homens

É realmente muito difícil para qualquer estúdio de animação conseguir fazer algo que se aproxime do que vemos acima. Levando em conta que os estúdios que adaptaram a obra não pareceram ter muito empenho na hora de animar Berserk, claro que o resultado seria negativo e levaria à critica dos fãs. A adaptação mais elogiada até agora é a clássica, de 1997 e contém 25 episódios, finalizando a trama logo após o Eclipse.

Os fãs até hoje sonham com uma adaptação que honre o legado de Kentaro Miura e toda a sua genialidade. Enquanto ao mangá, antes de falecer, Miura revelou ao seu amigo de infância, Kouji Mori, o final de Berserk e é ele o novo mangaká que assume o projeto, prometendo aos fãs entregar um fim fiel ao que Miura havia planejado. O que nos resta, como fã dessa grande obra, é aguardar e torcer para que Guts tenha um final feliz depois de uma vida tão difícil e que Caska se recupere após os traumas que vivenciou.

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