HQ icônica dos anos 80 é banida de escola dos Estados Unidos
HQ icônica dos anos 80 é banida de escola dos Estados Unidos
Maus, prestigiada HQ sobre os horrores do Holocausto, foi banido em votação unânime em escola do Tennessee; Decisão gerou polêmica e debates
Maus, a graphic novel de Art Spiegelman, é uma das HQs mais prestigiadas da história. A obra, que retrata o Holocausto com base nos relatos em primeira mão do pai do autor, é o único quadrinho a ter ganho um Pulitzer, e é considerado um marco para a mídia. Ainda assim, em 2022, uma escola nos Estados Unidos decidiu banir a obra de sua biblioteca.
O incidente ocorreu na escola do Condado de McMinn, no Tennessee, e o motivo alegado pela organização, para retirar a HQ das leituras recomendadas da oitava série, é “retratações de nudez” – que acontece em um único momento, em uma personagem que retrata a mãe do autor.
O debate todo se iniciou quando ficou claro que a alegação é fraca e que a decisão não é isolada, mas sim parte de um movimento maior nos EUA em que conservadores estão atacando a forma que escolas ensinam sobre racismo e o Holocausto, buscando emplacar seu revisionismo histórico sob a desculpa de “imparcialidade”.
Por mais que Maus seja protagonizada por ratos, gatos e porcos, a HQ é um retrato aprofundado dos horrores cometidos pelos nazistas contra os judeus durante a Segunda Guerra Mundial – e há um enorme movimento que busca negar a gravidade das atrocidades, ou então negar sua existência por completo.
Falando com a CNBC, Art Spiegelman se mostrou profundamente incomodado pela decisão, e disse que a decisão da escola é digna de uma obra distópica de George Orwell. O que agrava ainda mais o debate é o fato de que o banimento ocorreu em 26 de janeiro de 2022 – um dia antes do Dia Internacional da Lembrança do Holocausto.
Outros autores também se mostraram indignados. Neil Gaiman – de Sandman e Belas Maldições – foi sucinto em seu Twitter ao apontar que o absurdo serve justamente aos interesses do revisionismo histórico dos supremacistas brancos: “Só há um tipo de pessoa que votaria para banir Maus, seja lá como esse grupo gosta de chamar hoje em dia.”
No Twitter, o Museu do Holocausto dos EUA também se posicionou contra a decisão da escola, dizendo:
“Maus teve papel fundamental na educação sobre o Holocausto através de sua retratação detalhada e pessoal da experiência das vítimas e sobreviventes. Na véspera do Dia Internacional da Lembrança do Holocausto, é mais importante do que nunca que os estudantes aprendam essa história. O uso de livros como Maus para ensinar sobre o Holocausto pode inspirar alunos a pensar criticamente sobre o passado, e sobre seus papéis e responsabilidades hoje.”
A escola do Condado de McMinn, por sua vez, reforçou a decisão, e publicou um comunicado em seu site oficial defendendo a escolha, ainda que tentando dar o braço a torcer ao significado da HQ:
“Houve votação para retirar a HQ Maus das escolas do condado por seu uso desnecessário de profanidade, nudez e sua retratação de violência e suicidio. Olhando em geral, o comitê acredita que a obra é adulta demais para uso nas escolas.
Não diminuímos o valor de Maus como uma impactante e significativa obra literária, nem disputamos a importância de ensinar nossas crianças sobre as lições e realidades históricas e morais do Holocausto. Muito pelo contrário, pedimos aos nossos administradores para encontrarem outros trabalhos que cumpram o mesmo objetivo educacional, de forma mais apropriada para os mais novos. As atrocidades do Holocausto foram vergonhosas além de descrição, e todos temos a obrigação de garantir que gerações mais novas entendam seus horrores para que eventos assim nunca mais se repitam.”
A minuta da reunião do comitê até mostra que houve objeções entre os educadores, com um deles defendendo a forma que o evento histórico foi retratado, mas Maus acabou banida em votação unânime.
O debate ainda deve se estender, especialmente se outras escolas dos Estados Unidos seguirem pelo mesmo caminho. Por enquanto, ainda não há indícios de que o banimento será revertido.
Lançada entre 1980 e 1991, Maus se aprofunda nos horrores do Holocausto através de uma série de relatos do pai do autor Art Spielgelman, um judeu polonês que sobreviveu à perseguição e aos campos de concentração. O quadrinho segue sendo um dos mais vendidos e elogiados com reimpressões constantes – inclusive no Brasil.