Crítica: Trem-Bala é um surto com elenco estrelado que chega perto de ser ótimo
Crítica: Trem-Bala é um surto com elenco estrelado que chega perto de ser ótimo
Novo filme de David Leitch expande o estilo cômico de Deadpool mas peca pela ação morna e ritmo arrastado
Para quem é fã de ação, David Leitch é alguém com uma carreira verdadeiramente impressionante. Antes de se tornar cineasta, era um coordenador de coreografias e dublê com um currículo de peso, de Blade e Matrix à Anjos da Noite e a franquia Bourne.
Assim, é justo esperar que seus filmes tenham ação impressionante, algo que o próprio já provou que sabe fazer com Deadpool 2, Atômica e Velozes e Furiosos: Hobbs & Shaw. É uma pena que seu projeto mais ambicioso até agora, Trem-Bala, deixe a desejar justamente na falta de intensidade – o elemento que faltava para elevar uma obra divertida e surtada ao nível de excelência.
Ficha técnica
Título: Trem-Bala (Bullet Train)
Direção: David Leitch
Roteiro: Zak Olkewicz, baseado no livro de Kôtarô Isaka
Data de lançamento: 4 de agosto de 2022 (Brasil)
País de origem: Japão, Estados Unidos
Duração: 2h 6min
Sinopse: O mercenário mais azarado do mundo se vê arrastado para uma conspiração gigantesca, envolvendo todo tipo de mafioso, ao aceitar extrair uma maleta de dinheiro de um trem-bala que cruza o Japão.
Em desenvolvimento há alguns bons anos, Trem-Bala adapta o livro homônimo de Kotaro Isaka, que segue um mercenário supersticioso (vivido por Brad Pitt) que aceita a simples missão de extrair uma maleta de dinheiro de um trem-bala que cruza o Japão. Conhecido por sua falta de sorte, ele rapidamente se vê puxado para uma gigantesca conspiração envolvendo todo tipo de gente mau caráter.
O grande atrativo do filme é, sem dúvidas, seu elenco absurdamente talentoso, repleto de nomes de peso. Como o protagonista – conhecido apenas pelo codinome Joaninha -, Pitt mostra toda a sua força para a comédia, algo que infelizmente foi pouco explorado ao longo de sua carreira. É difícil imaginar outra pessoa (talvez Ryan Reynolds?) que conseguisse brilhar nesse papel, que pede tanto habilidade física para a porradaria quanto um ótimo timing cômico para entregar filosofias de vida, reflexões sobre a natureza da sorte e uma atitude desastrada ao mesmo tempo que troca socos com alguém.
Os demais personagens que cruzam o caminho do mercenário são igualmente charmosos e muito bem escalados. Hiroyuki Sanada (Mortal Kombat) e Andrew Koji (Warrior) equilibram o humor com performances mais sóbrias, de um pai e filho em distintas jornadas de vingança. Já Brian Tyree Henry (Atlanta) e Aaron Taylor-Johnson (Vingadores: Era de Ultron) roubam os holofotes como a dupla Limão e Tangerina, irmãos criminosos cheios de talento que vivem trocando farpas entre eles. Joey King (A Barraca do Beijo), por sua vez, consegue conquistar o seu lugar como uma jovem psicopata que é responsável por grande parte das desgraças que acontecem no trem, com humor ácido inabalado pela própria crueldade.
O elenco e o humor são os maiores triunfos da obra, que acabam conduzindo a trama para frente. Sempre há uma sacadinha, uma piada ou alguma cena pastelão para te deixar com um sorriso na cara, e é verdadeiramente impressionante a quantidade de ótimos atores reunidos em um único projeto. Há um conjunto de participações especiais que só passam a certeza de que David Leitch deve ser um cara bem gente boa para que tantos nomes de peso de Hollywood tenham conciliado suas agendas, só para darem as caras por alguns segundos no longa.
Da mesma forma que há muito a se elogiar em Trem-Bala, como sua estética regada à neon e sua ousadia em abraçar o absurdo, é difícil não sentir o ritmo arrastado pelo excesso de tudo. Aqui, fica claro que Leitch se encontrou como diretor em Deadpool 2, e ele tenta expandir o seu estilo de direção que transita entre a comédia e a ação. O problema é que o lado da ação fica devendo, e isso desequilibra toda a balança.
Na contramão de todos os divertidos absurdos que os personagens se envolvem, as cenas de porradaria ou tiroteios são bem comedidas, seguras e espaçadas. Por conta disso, o humor assume a tarefa de carregar o filme, o que resulta em vários momentos de impasse, em que uma piada simplesmente já não funciona mais, porém o roteiro e a montagem insistem em prolongá-la.
Um longa com pouco mais de duas horas de duração acaba parecendo arrastado por essa falta de dinamismo, com enormes bolsões que soam como um comediante de stand-up tentando arrancar qualquer reação da plateia ao invés de seguir com a próxima esquete. E o termo “esquete” é certeiro para descrever muito de Trem-Bala, que vê em todo personagem a oportunidade de apresentar situações divertidas de seu passado em flashbacks. Quando há tantos personagens assim, é bom deixar algumas coisas para a imaginação.
Ainda é bem satisfatório ver essa sequência de eventos aparentemente aleatórios se combinando em caos generalizado, mas frequentemente há a sensação de que a trama se expande para lados desnecessários apenas para tentar chegar em alguma piada, muitas vezes sem sucesso. A ideia é divertida no começo, e o objetivo é que tudo se conecte eventualmente, mas a abordagem enjoa rapidamente e ajuda a criar uma sensação de fadiga generalizada para o filme.
Mesmo que seja um filme longo e cansativo para uma comédia de ação, Trem-Bala é altamente aproveitável e merece honras por sua jornada absurda, elenco de peso com boas performances, e por seu humor – nos momentos em que as piadas funcionam, claro.
David Leitch não poupa esforços (ou grana do orçamento), e mira em criar uma versão ainda mais insana de uma premissa que poderia ter saído da mente dos Irmãos Coen ou de Quentin Tarantino. Por pouco ele não acerta em cheio, mas ainda é admirável vê-lo tentar.
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