Crítica: No Ritmo da Vida sonha em revolucionar o movimento Drag Queen, mas cai no estereótipo e mesmice
Crítica: No Ritmo da Vida sonha em revolucionar o movimento Drag Queen, mas cai no estereótipo e mesmice
Último filme da carreira de Cloris Leachman traz belas cenas, mas história frustrante
Já faz um tempo que o movimento Drag Queen ganhou espaço no mainstream. Saindo dos bares locais LGBTQIA+ e tomando realitys shows, a TV e música. A cultura que nasceu atrelada à identidade sexual, se tornou, enfim, o que é: performance artística. E é o que o diretor e roteirista, Phil Connell, tenta apresentar em No Ritmo da Vida. Protagonizado por Thomas Duplessie e sendo o último filme da carreira de Cloris Leachman, o longa segue a história da drag Fishy Falters.
Após uma desilusão romântica, o ator e performancer decide retornar para a casa de sua avó, Margaret. Lá, ele descobre que a vida da senhora está bem mais solitária e complicada do que parece. É então que Fishy decide dar um novo começo para sua vida, trabalhando em um bar LGBTQIA+ local e cuidando de sua avó. Entre crises existenciais, beijos com pouca química e algumas atuações questionáveis, Connell se esquece que Drag Queens não são tão underground quando ele faz parecer ser.
Título: No Ritmo da Vida (Jump Darling)
Direção: Phil Connell
Roteiro: Phil Connell e Genevive Scott
Data de lançamento: 03 de março de 2022 (Brasil)
Duração: 1h 30min
Sinopse: Após uma separação, Russell deixa a cidade e parte para o campo, onde sua avó doente Margaret resiste à ideia de viver em um lar de idosos. Enquanto cuida de sua avó, Russell procura novas perspectivas como uma drag queen novata em um bar local e acaba tendo um inesperado encontro romântico.
Personagens obtusos, roteiro complicado
Ela risca o fósforo. Uma, duas, três vezes. E nada. O telefone toca, mas Margaret deixa tocar até cair na caixa postal e a voz de seu neto ecoar pela casa. Com o gás ligado, o fogo do fósforo se acende e tudo parece pegar fogo. Sendo a cena de abertura do filme, é curioso pensar que o momento de maior impacto de No Ritmo da Vida não tem relação nenhuma com a temática principal. Nos apresentando pouco, ou quase nada, da vida de Margaret, ficamos com uma sensação de que o filme não cumpre o que promete.
Algo estampado em todo o material promocional do longa. Sempre focando em cores vibrantes, no neto e na avó, tudo parecia apontar para um road trip divertido sobre uma mulher idosa encontrando a felicidade na vida. Mas, o que recebemos é um protagonista confuso, um drama cheio de estereótipos para justificar suas escolhas e uma trama que seria inventiva alguns anos atrás.
Diferente do curta do mesmo diretor, Kissing Drew, de 2013, No Ritmo da Vida parece ter sido feito na época errada. Talvez no início dos anos 2010, ver um homem branco enfrentar seu namorado negro e sua heteronormatividade, falar sobre “desconstrução e sair de caixas” fosse algo novo, mas em 2022, parece datado. Não que o assunto não seja mais relevante, mas cada performance de Fishy Falters está carregada da intenção de quebrar normas e ser revolucionário, mas ao mesmo tempo, tudo parece vazio e repetitivo.
Dessa forma, os lip syncs ganham mais evidência, ofuscando qualquer chance do filme sair dessa “caixa” que o protagonista tanto critica. Seja pela sua iluminação criativa ou pelo talento de Thomas, assisti-lo se maquiando e performando é um agrado no meio de uma história morna.
Uma identidade queer, mas dicotômica
História que se debruça em uma dicotomia desnecessária sobre gênero. Enquanto o personagem principal serve como parâmetro para quebrar padrões, a personificação de uma identidade queer, suas contrapartes românticas são homens obtusos, machistas e problemáticos.
Entre constantes tentativas de tentar humilhá-lo até manter um relacionamento hétero nas sombras, eles parecem forçar uma falta de simpatia e entendimento ao redor da cultura drag. De alguma forma, é como se estivessem congelados em um mundo onde não é possível construir uma carreira, ganhar dinheiro e, até mesmo, ser famoso ao performar em bares LGBTQIA+ em uma era pós-“RuPaul’s Drag Race“.
O mais frustrante é como nos é apresentado esses dois universos que não conversam entre si. Margaret, por exemplo, aceita e em nenhum momento questiona a identidade do neto. A mãe de Fishy, inclusive, o apoia e bate de frente com o ex-namorado da drag. Outras características positivas vão de existir um bar LGBTQIA+ nessa cidade pequena do interior, que também sempre parecem oferecer ajuda quando precisa.
Do outro lado, temos esses personagens incompletos e vazios — congelados no tempo. O que ganha força na trama é a atriz Cloris Leachman. Mesmo que sua atuação beire a um filme diferente em que Margaret é a protagonista, é divertido acompanhar essa frágil e idosa mulher. Seus antigos sonhos, seus traumas e sua luta em manter o neto vivo, bem e feliz.
Entre algumas cenas de tirar o fôlego, e outras dispensáveis, No Ritmo da Vida se beneficiaria se fosse um curta. Resumindo a história e focando nas performances de Duplessie, seria possível entrarmos em contato com esse mundo colorido do diretor, mas sem a necessidade de entrar em eixos temáticos já tão debatidos. Porém, o longa parece o tipo de produção que pode conseguir encontrar seu público alvo. Mesmo com seus problemas e caindo na mesmice, ele se apoia na experiência de uma grande parte da comunidade gay, não apenas drag, mas também branca. Apenas não é um lugar para colocar suas expectativas.
No Ritmo da Vida estreia nos cinemas brasileiros em 3 de março de 2022.
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