Crítica – Men: Faces do Medo é um terror “feministo” para homens de bem
Crítica – Men: Faces do Medo é um terror “feministo” para homens de bem
“Nem todos homens, mas sempre um homem”
O horror é político. Durante anos, vimos metáforas sendo construídas em tela através de assassinos com facões e demônios do sonho. As referências sempre estiveram lá, alguns decidiram olhar, outros não. Em Men: Faces do Medo, Alex Garland tenta trabalhar essa mesma sutileza do olhar entre horror e sociedade, mas falha ao entregar um conto de fadas que ecoa um belo “Mais feministo que eu?”.
Ficha técnica
Título: Men: Faces do Medo (Men)
Direção e roteiro: Alex Garland
Data de lançamento: 08 de setembro de 2022 (Brasil)
País de origem: Estados Unidos
Duração: 1h 40min
Sinopse: Uma jovem vai de férias para o interior da Inglaterra após a morte de seu ex-marido. Lá, ela se percebe cercada por curiosos homens que compartilham o mesmo rosto.
Um olhar sobre relacionamentos abusivos
Tratar de relações abusivas no horror não é algo recente. Pelo contrário, Ida Lupino, em O Mundo É o Culpado, de 1950, cria uma cena de puro horror e desconforto entre uma mulher e seu perseguidor. Já Emmerald Fennel criou em 2020 uma trama sarcástica sobre abuso e vingança em Bela Vingança.
Setenta anos separam essas duas obras e, mesmo assim, tratam de assuntos que ainda são capazes de paralisar mulheres. Enquanto essas diretoras dão voz a esses medos, Garland parece derrapar no desejo de falar sobre o assunto, mas não ter experiência alguma para tratá-lo.
Muito além de uma falta de “lugar de fala”, o diretor de Ex-Machina cria uma trama repleta de referências pagãs e atuações incríveis, mas, no fim do dia, não tem nada para falar. Em Men: Faces do Medo, seguimos Harper e seu desejo de mudar de ares após o traumático término de seu antigo relacionamento.
Ao “fugir” por alguns dias para uma cidade no interior da Inglaterra, a mulher se vê em um vilarejo repleto de homens que compartilham um rosto e opiniões controversas sobre ela. Entre debates sobre masculinidade tóxica e o medo da sombra em uma rua escura, Garland tenta criar um horror atmosférico que promete interpretações profundas e cenas, no mínimo, perturbadoras.
Uma boa ideia de execução inesperada
Pensando nessas peculiaridades de Men, o que se destaca é a atuação de Jessie Buckley e Rory Kinnear. Enquanto Jessie tem o desafio de se mostrar traumatizada, mas disposta a virar a página, Rory dá seu rosto para diferentes pessoas: um padre, um dono de bar, uma criança.
A performance do antigo monstro de Frankstein de Penny Dreadful consegue adicionar camadas a história, principalmente, por conta de sua bizarrice. O desconforto de vê-lo encarnando várias personalidades é o que fisga o público a se manter até o final.
Mas, se Rory mantém o público na cadeira, querendo descobrir o que acontece nessa curiosa vila, o problema do novo filme de Garland é o seu final. Infelizmente, a história de abuso do diretor se torna uma fatídica crônica sobre não existir culpados em relacionamentos abusivos, pois, invariavelmente, “ambos são culpados”.
Interpretações do filme como essa surgem em como a personagem de Jessie age com seu antigo parceiro, interpretado por Paapa Essiedu, em cenas de flashback. Como também na postura — psicológica ou mística — de dar um mesmo rosto a todos os homens da vila
Não é difícil pensar na famosa frase “Nem todos os homens, mas sempre um homem” quando se chega ao fim do filme. Porém, se a frase possui sentido no mundo real, em Men: Faces da Morte, ela se enfraquece por ser dita por um homem.
Ouso dizer que o longa irá funcionar para aqueles que nunca compreenderam o medo feminino de se sair à noite na rua ou o assédio sofrido diariamente. É irônico admitir isso, mas é um filme sobre feminismo feito por e para homens. Logo, não espere grandes desenvolvimentos sobre o assunto, pois o longa prefere se manter no raso para não se enrolar.
Desta forma, Men se sobressai por sua ideia que, de acordo com o diretor, esteve engavetada por cerca de 15 anos. Mas, peca ao tratar de feminismo e masculinidade tóxica apenas pelo desejo de fazer parte do movimento, esquecendo que o ponto não é apenas “falar sobre”, mas também “escutar outras pessoas falarem sobre”.
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