Crítica – Euphoria: Segunda temporada aposta em momentos mais dramáticos, mas esquece o desenvolvimento de seus personagens
Crítica – Euphoria: Segunda temporada aposta em momentos mais dramáticos, mas esquece o desenvolvimento de seus personagens
Em seu segundo ano, a série da HBO acabou se tornando um compilado de diálogos vazios, juntamente com a ausência de profundidade dos arcos de seus personagens
A segunda temporada da aclamada série Euphoria, da HBO, chegou em janeiro deste ano já quebrando recordes de audiência e conquistando ainda mais o público. Criada, dirigida e roteirizada por Sam Levinson, o segundo capítulo da produção foi lançado quase três anos após sua estreia, deixando os fãs com expectativas altíssimas para a continuação da história de Rue (Zendaya) e Jules (Hunter Schafer).
Entretanto, o desenvolvimento raso e bastante preguiçoso da segunda temporada fez com que a série se perdesse no meio do caminho. O que começou com uma ideia promissora abriu espaço para uma produção que prefere se apoiar em visuais impressionantes e efeitos técnicos ao invés de destacar aquilo que a série tem de melhor: os personagens e seus desenvolvimentos particulares, em meio a uma fase repleta de transformações.
Ficha técnica
Título: Euphoria: Segunda Temporada
Criador, roteirista e diretor: Sam Levinson
Ano: 2022
Emissora/Streaming: HBO e HBO Max
Número de episódios: 8
Sinopse: A segunda temporada de Euphoria explora novos lados dos personagens que não tiveram muito destaque na primeira temporada e ainda revela o destino de Rue. Em meio a caminhos entrelaçados, Rue precisa encontrar esperança enquanto tenta equilibrar as pressões do amor, perda e vício.
Novos dramas, novos desafios
Uma das coisas que mais chamaram atenção em Euphoria, desde sua estreia, é a maneira como certos dramas da vida adolescente são retratados. Sem romantizações, Levinson apresentou ao público uma trama moderna e repleta de debates pertinentes à atualidade, como questões de gênero, sexo, drogas, abusos psicológicos e outras temáticas mais. O que muitos enxergavam como apenas a “nova Skins”, na verdade, mostrou-se mais cativante para a geração Z por trazer personagens identificáveis e carismáticos, o carro-chefe da produção.
Mais do que apenas uma história sobre Rue, figura central que é brilhantemente interpretada por Zendaya, e suas questões envolvendo o consumo de drogas, Euphoria trouxe, em seu primeiro ano, um desenvolvimento interessante para outros personagens da trama, como Jules, Kat (Barbie Ferreira), Nate (Jacob Elordi) e McKay (Algee Smith), por exemplo.
Já na segunda temporada, enquanto uns recebem novas motivações, outros são completamente descartados, como é o caso de McKay e Kat, que passam totalmente despercebidos no segundo ano e não apresentam nenhum desenvolvimento significativo ao longo dos episódios. A própria Kat é apagada, passando a ser meramente a “amiga da Maddy” (Alexa Demie), enquanto McKay, que poderia ter ganhado um espaço maior após os acontecimentos traumáticos da primeira temporada, é praticamente ignorado.
Neste segundo ano, Levinson optou por dar um enfoque maior no “triângulo amoroso” entre Maddy, Cassie (Sydney Sweeney) e Nate. Dos três, Sweeney é a que mais brilha na pele de sua personagem, mostrando um lado ainda mais caótico e problemático de Cassie após iniciar um relacionamento abusivo com Nate. Mas, mesmo que a atriz tenha entregado atuações impecáveis, as escolhas narrativas fizeram com que o desenvolvimento de seu arco se tornasse enfadonho e até, em certos momentos, beirando ao ridículo com frases de efeito simplórias.
Saindo do eixo Maddy-Cassie-Nate, temos outro drama amoroso, desta vez vividos por Jules, Rue e Elliot (Dominic Fike) — novo rosto da trama que, assim como a personagem de Zendaya, também enfrenta problemas com o consumo excessivo de drogas. Mas, o que poderia se tornar uma boa amizade, nas circunstâncias certas, acaba saindo pela culatra. Elliot e Rue despertam o pior um no outro, e essa era a última coisa que a jovem precisava em um momento tão delicado da vida.
Já Jules, uma das personagens mais interessantes da série, passa a ser uma mera coadjuvante na história de Rue. Após os acontecimentos da primeira temporada e os dois episódios especiais lançados entre 2020 e 2021, era de se esperar que a relação entre as duas obtivesse um maior aprofundamento, mas não é isso que ocorre. Tudo fica nas sombras da chegada de Elliot, que é visto como uma “ameaça”, na primeira impressão de Jules.
As recaídas de Rue
Mas há pontos positivos nesta temporada. Um deles foi o aprofundamento da relação de Rue com as drogas. Sabemos que a adolescente enfrenta o problema desde muito jovem, mas é ao longo dos episódios do segundo ano que a vemos ultrapassar seus próprios limites, envolvendo-se com pessoas perigosas inclusive, enquanto suas recaídas se tornam cada vez piores.
Aqui vale destacar o quinto episódio (Stand Still Like the Hummingbird), um dos melhores de Euphoria até então. Levinson conseguiu extrair uma camada de profundidade ainda maior da personagem de Zendaya, que mais uma vez excedeu as expectativas e comprovou o porquê ela é considerada uma das melhores atrizes de sua geração.
É neste episódio que temos uma carga emocional altíssima: Rue tem uma crise de abstinência e acaba descontando toda a sua frustração em sua mãe e a irmã, protagonizando cenas dolorosas de serem assistidas.
De todos os personagens, Rue é aquela que mais se manteve coerente. Seu crescimento desde os primeiros episódios é perceptível: vemos ela errando e tentando acertar, mas muitas vezes ainda caindo nas armadilhas que ela mesma monta. Acompanhamos sua jornada em busca de uma solução para todos os seus problemas e, no final, conseguimos perceber as mudanças que ocorreram em sua alma durante o percurso.
A nossa vida
Não dá para falar da segunda temporada de Euphoria sem mencionar Lexi (Maude Apatow). Até o momento, a personagem, que se resumia em ser apenas a irmã de Cassie, ainda não tinha mostrado suas garras.
Felizmente, entre acertos e erros, Levinson trouxe a personagem para o centro dos holofotes com a estreia da peça Our Life (Nossa Vida, em tradução livre). A produção foi criada, dirigida e roteirizada pela própria Lexi (seria um reflexo do próprio Sam Levinson na série?) a partir de suas observações e vivências dos colegas que a cercam. Também vemos a jovem criando um novo laço de amizade com Fezco (Angus Cloud), uma relação que só ganhou um destaque maior nos últimos episódios da temporada.
Falando na conclusão do segundo capítulo de Euphoria, a sensação que fica é a de que tudo aconteceu, mas nada aconteceu, de fato. Levinson promete um grand finale à altura do sucesso da série, mas acaba optando por caminhos nebulosos onde nenhum personagem, com exceção de Rue e Lexi, consegue encontrar a si mesmo no meio dos desafios que a trama aborda. É quase como se houvesse um incômodo ao longo dos episódios, uma peça faltando no tabuleiro que fez com que a segunda temporada perdesse seu próprio sentido.
Apesar das diversas possibilidades narrativas e novos arcos ainda mais dramáticos incluídos no enredo, Levinson percorre alguns caminhos que deixam a desejar. Tirando algumas exceções, a trama acaba se tornando um enorme compilado de luzes neon e diálogos vazios, sem acrescentar uma profundidade necessária para que os personagens consigam avançar em seus arcos de forma significativa.
Então, o que esperar de uma terceira temporada? O caminho mais fácil seria recuperar a força de seus personagens e ter a coragem para desenvolvê-los com competência, indo além da superfície e entendendo que mostrar cenas chocantes ou se apoiar em técnicas especiais não são o suficiente para manter a qualidade de um enredo. Pelo visto, podemos esperar um novo recomeço para Rue, mas até que ponto esse recomeço vai ser condizente com o que a série vem mostrando? Bom, só o tempo dirá.
As duas temporadas de Euphoria, juntamente com seus dois episódios especiais, estão disponíveis na HBO Max.
Aproveite também: