Crítica: Enola Holmes 2, da Netflix, compensa sua duração extensa com muito carisma

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Crítica: Enola Holmes 2, da Netflix, compensa sua duração extensa com muito carisma

Por Gus Fiaux

Lançado em 2020, Enola Holmes foi um grande sucesso para a conta da Netflix, apresentando uma história bem… elementar, usando personagens criados por Sir Arthur Conan Doyle e expandindo a mitologia ao adaptar a série de livros de Nancy Springer, que apresenta uma irmã mais nova para Sherlock Holmes, que compartilha de seu talento para a investigação.

Agora, dois anos após a estreia do primeiro longa, a franquia está de volta com um novo capítulo. Enola Holmes 2 traz de volta Millie Bobby Brown ao papel da jovem detetive, dessa vez desvendando um novo mistério, enquanto tem a ajuda de um elenco de apoio estelar, composto por Henry CavillHelena Bonham CarterAdeel Akhtar, Louis Partridge Susie Wokoma. Mas afinal, será que a sequência consegue manter o nível do primeiro longa?

Ficha técnica

Título: Enola Holmes 2

 

Direção: Harry Bradbeer

 

Roteiro: Jack Thorne

 

Data de lançamento: 4 de novembro (Brasil)

 

País de origem: Estados Unidos e Reino Unido

 

Duração: 2 horas e 10 minutos

 

Sinopse: Em seu primeiro caso oficial como detetive, Enola precisa encontrar uma menina desaparecida. Para isso, ela contará com a ajuda dos amigos e do irmão, Sherlock.

Enola Holmes 2 está disponível na Netflix.

Enola Holmes 2 não está interessado em ser apenas um repeteco do primeiro filme

Enola Holmes 2 começa com uma cena onde vemos a protagonista titular correndo pelas ruas de Londres, fugindo de policiais e se esquivando entre becos e vielas. A ação então para abruptamente quando a jovem personagem vivida por Millie Bobby Brown para e diz: “deixe-me explicar“. De alguma forma, essa breve sequência já nos prepara de vez para tudo que veremos nas duas horas seguintes do novo filme da Netflix.

Quando foi lançado em 2020, no meio da pandemia, o primeiro filme da franquia se tornou um sucesso instantâneo para a plataforma de streaming. Com um carisma de milhões, um elenco intrigante e, é claro, uma trama arquitetada sob medida para agradar o algoritmo, Enola Holmes conquistou o público não só por seus acertos, mas também pela forma como conseguiu vender uma nova galinha dos ovos de ouro para o serviço digital.

Com tanto sucesso, é óbvio que uma sequência seria anunciada em breve – o que aconteceu – e ela acaba de chegar ao catálogo do streaming, dessa vez lidando com uma protagonista um pouco mais amadurecida, mas que ainda segue fiel em seu idealismo e sua vontade de mudar o mundo. E por mais que a sequência dê alguns escorregos de vez em quando, ainda é um acerto impressionante.

Enola continua a figura espirituosa e aventureira do primeiro filme.

Na trama, Enola se tornou uma detetive “oficial”, mas ainda não conseguiu juntar uma clientela fiel, até que um dia, recebe a visita da jovem Bessie Chapman, que pede ajuda para descobrir o paradeiro de sua irmã, desaparecida há alguns dias. Isso leva a detetive direto para uma fábrica de fósforos, onde descobre condições abusivas de trabalho e um mistério que lentamente começa a se desenrolar.

Por mais que tivesse gostado bastante do primeiro filme e falado sobre como o potencial da franquia era tremendo, a simples sinopse me deixou com vários pés atrás, principalmente porque denotava uma tentativa de repetir tudo que havia funcionado no longa de 2020. Uau, mais uma trama de desaparecimento. Que originalidade. Porém, pouco a pouco, Enola Holmes 2 começou a mostrar que não estava interessado em ser apenas um repeteco.

A grande prova disso está na personagem-título, vivida por Millie Bobby Brown. Se, no primeiro filme, Enola era basicamente uma “versão feminina e mais nova” de Sherlock Holmes, sem muito espaço para crescer debaixo da sombra de seu irmão, a continuação prova que ela não só amadureceu como mulher, mas também como detetive. E é justamente nas interações e “picuinhas fraternas” que isso se mostra da melhor forma.

Os melhores momentos do filme se baseiam na interação de Enola com outros personagens.

O Sherlock de Henry Cavill tem um papel mais importante na trama e divide um bom tempo de tela com sua irmã, o que acaba se tornando um baita acerto pela forma como o roteiro de Jack Thorne nunca nos faz pensar que esse é um filme sobre o personagem criado por Sir Arthur Conan Doyle, ainda que ele seja uma peça crucial da trama. A dinâmica entre ele e Enola é o ponto alto, seja pelas alfinetadas ou pelos momentos mais tenros da dupla.

Contudo, nem tudo no novo filme de Harry Bradbeer são flores. O primeiro filme já havia mostrado que o diretor gosta de brincar com a ambientação e toda a atmosfera de uma Londres vitoriana durante a Revolução Industrial. E nesse segundo, nota-se uma necessidade abundante de exposição e de subtramas para compor todo esse universo, o que não seria um problema se não desviasse tanto o foco da jornada de Enola.

Ainda assim, há um carisma inegável na forma como os personagens, seus dramas e dilemas são passados, seja pelo elenco de apoio afiadíssimo ou pelos diálogos mais incisivos do roteiro. Nesse sentido, a dupla dinâmica formada por Eudoria (Helena Bonham Carter) e Edith (Susie Wokoma) traz um gostinho especial, cheio de piadas intercaladas por discussões sociais que já eram abundantes no primeiro filme.

Até perseguição de carruagem nós temos!

E ainda que todo o incidente envolvendo a fábrica de fósforos seja baseado em uma história real, o que impressiona é como o diretor consegue manter o nível na estilização de seu universo. Ele quer fazer uma discussão sobre o papel do proletariado e como mulheres se tornaram exploradas ao máximo no período vitoriano, o que carrega um senso de revolução que combina não só com a trama montada até ali, mas até com a energia anárquica de Enola.

Agora, quanto a Tewkesbury (Louis Partridge), tive um sentimento agridoce. Embora o ator consiga dar ao lorde uma personalidade única, afável e muito gentil, a impressão que sobra é que ele só está ali na trama para servir como um lembrete de que Enola não pode apenas ter uma vida profissional, mas deve se preocupar em construir laços com pessoas que a amam.

Isso não é um problema em si, mas a trama de ambos não acrescenta muito mais que as várias cenas que Enola tem com seu irmão ou sua mãe, por exemplo. É quase como se o algoritmo estivesse o tempo todo falando por trás das câmeras: “Precisamos de um romance!” e no fim, é isso que temos, um caso amoroso que soa artificial e fajuto, e que pouco acrescenta à jornada da protagonista.

Mira Troy é uma das melhores adições à sequência.

O desfecho do filme me incomoda por alguns motivos. Primeiro, parece que a trama se encerra quando o marcador chega à 1 hora e 40 minutos de duração, mas ainda assim temos mais meia hora dedicada a construir suspense e nos trazer mais uma reviravolta. Se isso funciona graças à presença de Mira Troy (Sharon Duncan-Brewster), ainda há um sentimento de que o filme estendeu sua estadia até demais, chegando ao ponto de ficar cansativo.

Mas no fim, tudo isso é compensado. Enola Holmes 2 pode ter seus problemas, mas mostra como a saga juvenil da Netflix ainda tem potencial para se expandir e quiçá virar um universo compartilhado. Basta pensar no teaser que é deixado pouco antes dos créditos iniciais e que envolve Sherlock Holmes e um outro personagem… elementar. Resta saber se a plataforma de streaming quer seguir nesse direcionamento.

De um jeito ou de outro, temos aqui um outro exemplo de filme que é claramente montado por algoritmo mas que, de alguma forma, ainda tem muita alma e coração. Claro, ele ainda poderia aparar algumas pontas e nos trazer uma trama mais direta e sem complicações, mas mesmo que passe um pouco do ponto, ainda é muito reconfortante ver Millie Bobby Brown e Henry Cavill tendo a chance de colocar todo seu carisma para jogo.

Nota 3,5/5

Enola Holmes 2 está disponível na Netflix.

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