Crítica: Cavaleiro da Lua, Temporada 1

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Crítica: Cavaleiro da Lua, Temporada 1

Por Leo Gravena

Quando falamos de séries de drama, existem dois tipos de formato: o “episódico” e o “serializado”. O primeiro termo se refere à séries como Scooby-Doo, Supernatural nas primeiras temporadas ou qualquer CSI de uma grande cidade americana: episódios soltos, nos quais ao final daquela hora toda a trama será resolvida e o espectador não precisa acompanhar a temporada completa para saber o que está acontecendo.

Já uma série com episódios serializados cria uma trama contínua, como uma novela, na qual deixando de ver um ou mais episódios o espectador perderá bastante da história que está sendo contada. Breaking Bad, Westworld, Stranger Things, todas elas possuem uma trama ligada por seus episódios de forma que cada um funciona como um capítulo de um livro.

Cavaleiro da Lua, a nova série da Marvel, não é uma nem outra. Na verdade, ela deixa claro algo que já era sentido desde Wandavision e Loki, as produções da Marvel Studios para o Disney+ não são séries, mas sim longos filmes divididos em partes – e se nas produções iniciais ainda havia um cuidado para tentar fazer com que elas se parecessem com seriados de TV, aqui temos um completo e total desrespeito por essa mídia. Cavaleiro da Lua não é uma série, não tenta ser uma série, mas continua se vendendo como uma.

Ficha Técnica:

Título: Cavaleiro da Lua (Moon Knith)

 

Criação e roteiro: Jeremy Slater

 

Direção: Mohamed Diab, Justin Benson e Aaron Moorhead

 

Ano: 2022 (Disney+)

 

Número de episódios: 6 (1ª Temporada)

 

Sinopse: Marc Spector, um mercenário com transtorno dissociativo de identidade, se envolve em um mistério perigoso envolvendo deuses egípcios junto de sua segunda personalidade, Steven Grant.

Cavaleiro da Lua está completa no Disney+

No mundo das ideias, Cavaleiro da Lua tinha tudo para ser uma das melhores produções do Universo Cinematográfico da Marvel. Com roteiro de Jeremy Slater, responsável por séries como The Umbrella Academy e The Exorcist (duas séries que trabalham muito bem o formato serializado), a trama tinha tudo para ser ótima, porém a falta de um showrunner e de bons diretores condenaram a produção ao fracasso.

Em séries que são séries, e não grandes filmes divididos em partes que não se importam com o formato de TV/Streaming, o papel do showrunner é crucial para dar unidade a qualquer produção. Mesmo com uma grande sala de roteiristas e diversos diretores, o showrunner é o principal produtor-executivo a tomar as decisões e manter a coerência da visão e tramas ao longo dos episódios em uma temporada.

A Marvel Studios se recusa a utilizar esse cargo, com apenas diretores e roteiristas sendo comandados por um produtor da Marvel Studios e Kevin Feige, o Chefe do estúdio, que mesmo sabendo muito bem fazer um grande universo cinematográfico nos cinemas, não possuem a mínima ideia do que estão fazendo com o formato de seriado.

Konshu, o Deus da Lua, em cena de Cavaleiro da Lua

Isso fica claro especialmente com os episódios 4 e 5, na metade de “A Tumba” temos Marc Spector (Oscar Isaac) levando um tiro e “morrendo”, sendo levado para um pós-vida no qual “O Manicômio” das HQs do herói escritas por Jeff Lemire é trazido à vida para apresentar seu passado.

O problema aqui é como tudo isso é apresentado e trazido em tela. Mesmo o quinto episódio de Cavaleiro da Lua sendo, de longe, o melhor episódio da série, ele ainda é refém da mediocridade de seus capítulos anteriores.

Enquanto “a morte” do protagonista teria sido um ótimo gancho para um próximo episódio, com seus últimos segundos mostrando Marc em um hospital psiquiátrico, a série decide transformar todo o terceiro ato em uma introdução para a trama do episódio seguinte, pois a verdade é que a série não foi pensada como uma série (ou minissérie, neste caso), apenas um grande e longo filme de 6 horas que depois foi picotado para tentar emular o formato.

Marc e Steven no final do quarto episódio de Cavaleiro da Lua

Honestamente, chegar e falar que Cavaleiro da Lua não é uma “série de verdade” faz com que eu me sinta um velho crítico que acha que apenas os clássicos dos anos 50 (e antes são bons) e tudo o que veio depois, isso porque a Disney e Marvel Studios faz uma propaganda muito boa em querer mostrar como eles são para frente e estão acima de algo tão pífio quanto o formato serializado de uma série de TV.

É fácil pensar “para que seguir esse formato que existe faz anos e não possui mais serventia?” A resposta mais simples é que isso é apenas uma falácia. A Marvel Studios e a Disney não estão verdadeiramente aplicadas em avançar a maneira de se contar histórias em séries de TV e Streaming; eles querem apenas uma saída fácil e confortável para continuar fazendo o que sempre fizeram.

Isso fica claro no caso de remover completamente o cargo showrunner da equação. Um bom showrunner teria conseguido ajustar e melhorar a direção bagunçada de Justin Benson e Aaron Moorhead para casar melhor com o tom mais sóbrio e direto de Mohamed Diab. Enquanto a dupla de diretores é bem abaixo da média, principalmente quando o assunto são cenas de ação, Diab consegue trabalhar muito bem os momentos dramáticos ao lado de Oscar Isaac. Mas ao assistir a série completa, fica claro como não existe uma unidade ali, no fim a trama parece mais uma colcha de retalhos na qual cada parte não combina com a anterior.

Atuação de Ethan Hawke salva o vilão nada memorável Arthur Harrow.

Mas a direção e edição bagunçadas de lado, o alto e o baixo de Cavaleiro da Lua vem justamente de seu ator principal: Oscar Isaac.

Acredito, verdadeiramente, que Oscar Isaac é um dos grandes atores dessa geração. Inside Llewyn Davis: Balada de um Homem Comum é um dos meus filmes favoritos e o ator sempre se mostrou excelente em papéis dramáticos como em O Ano Mais Violento, Ex_Machina: Instinto Artificial e na minissérie Cenas de um Casamento. Porém, como qualquer outro ator, Isaac não é perfeito e ele não é um bom ator de comédia.

Dessa forma, quando está como Marc, Isaac está em seu ápice; as cenas dramáticas apresentadas no quinto episódio, “O Manicômio”, mostram claramente o poder do ator em conseguir fazer com que qualquer um fique completamente hipnotizado por sua atuação. Na verdade, o trabalho do ator nesse episódio é tão bom que quase faz com que você se esqueça o quão ruim os episódios anteriores foram. Isso sim é um excelente trabalho.

Porém, quando está como o bobalhão Steven Grant, Isaac não convence. Seja um problema do roteiro, direção ou apenas escolha de atuação do protagonista da série, a cada vez que a personalidade mais infantil de Marc aparecia era doloroso de se ver, ainda mais com as piadas forçadas e cenas de ação mal dirigidas. Era claro que Isaac não estava no personagem tanto quanto com Marc, fazendo com que os primeiros episódios, com maior foco em Steven, fossem um verdadeiro suplício.

Oscar Isaac é um dos melhores atores a pisar no MCU, porém Cavaleiro da Lua não utiliza todo seu potencial

Mesmo com todos esses problemas, Marc Spector é um personagem bastante carismático e, mesmo Cavaleiro da Lua tendo sido vendida como minissérie – para concorrer em premiações e ter mais chances – ela certamente vai receber uma segunda temporada e veremos mais do vigilante. Só nos resta esperar que com uma equipe de diretores e produtores mais competente.

Cavaleiro da Lua tem bons momentos, em especial seu quinto episódio, porém eles acabam sendo ofuscados pela mediocridade de sua produção técnica e artificialidade de seus personagens. E aqui, outro problema; mesmo sendo uma série com seis episódios de mais de 40 minutos para desenvolver seus personagens, ao final da trama quase todos eles continuam tendo a profundidade de uma banheira de bebê.

Mesmo transbordando carisma, May Calamawy não faz muito como Layla El-Faouly, andando de um lado para o outro, ajudando Marc/Steven e tendo uma trama envolvendo o pai que some tão rápido quanto surge – ela não é exatamente uma personagem tanto quanto uma escada para o desenvolvimento do protagonista, mesmo seus momentos mais icônicos não são seus, tendo como objetivo a Marvel/Disney mostrar sua “grande importância cultural” e como ela se preocupa com uma representatividade rasa que agrega pouco em um diálogo importantíssimo.

Layla ganha um visual incrível como avatar de Tuéris… e é isso.

Qualquer outro ator menor no papel de Arthur Harrow teria sumido em meio à bagunça de Cavaleiro da Lua, mas Ethan Hawke consegue segurar as pontas e mesmo com a falta de uma história atraente para o vilão, ele cativa o espectador porque é um ator tão bom que mesmo se estivesse recitando a abertura de Backyardigans ainda conseguiria passar o tom ameaçador que Harrow precisava. Mesmo isso sendo um elogio para Hawke, não é para a série.

Se você tem Oscar Isaac e Ethan Hawke no seu elenco e não o utiliza ao máximo o talento de ambos, tem algo de errado ai. É como ter uma Ferrari e nunca acelerar acima dos 60km/h, é um crime contra a arte da atuação e acima de tudo, um desrespeito com os espectadores e com os próprios atores que são mais do que capazes de entregar um trabalho excepcional.

O Cavaleiro da Lua irá retornar, isso é mais do que certo. Mas em sua minissérie de estreia ele não conseguiu impressionar e mesmo os momentos mais bons e interessantes acabam sendo ofuscados pelos ruins.

Ao invés do brilho da lua, temos um eclipse lunar que traz apenas a escuridão.

Nota: 2/5

Confira também os easter-eggs e referências no sexto episódio de Cavaleiro da Lua: