Crítica – Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore é o melhor filme da franquia, mas ainda sofre para encontrar relevância
Crítica – Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore é o melhor filme da franquia, mas ainda sofre para encontrar relevância
Terceiro filme tenta consertar os erros do passado, mas ainda apela para a nostalgia exagerada ao invés de tentar criar um universo único
Após quatro anos de espera (e diversas polêmicas), o fantástico mundo de Harry Potter está de volta com Animais Fantásticos, desta vez com seu terceiro filme, intitulado Os Segredos de Dumbledore. Com o retorno de David Yates na direção e mais um roteiro assinado por J. K. Rowling, que agora colabora com Steve Kloves (o roteirista de quase todas as adaptações da história do Escolhido para o cinema), certamente havia uma atmosfera bastante nebulosa permeando o lançamento do novo longa da franquia, que até então continuava falhando ao tentar captar a essência da mitologia.
Neste terceiro filme, a sensação de vazio persiste. Embora seja a produção mais consistente da franquia até o momento, Os Segredos de Dumbledore ainda assim não consegue apresentar algo que seja remotamente interessante ou ambicioso, recorrendo à nostalgia exagerada para tentar cobrir os erros de seu próprio passado. É como se a história estivesse presa em um complicado labirinto, onde seus personagens não fazem ideia de como sair ou nem ao menos como chegaram até ali. Há elementos interessantes, mas nenhum feitiço, até o momento, parece ser a solução para o futuro da franquia.
Ficha técnica
Título: Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore
Direção: David Yates
Roteiro: Steve Kloves e J. K. Rowling
Data de lançamento: 14 de abril de 2022
País de origem: Reino Unido e Estados Unidos
Duração: 2h 22min
Sinopse: O professor Alvo Dumbledore (Jude Law) sabe que o poderoso mago das trevas Gellert Grindelwald (Mads Mikkelsen) está se movimentando para assumir o controle do mundo mágico. Incapaz de detê-lo sozinho, ele pede ao magizoologista Newt Scamander (Eddie Redmayne) para liderar uma intrépida equipe de bruxos, bruxas e um corajoso padeiro trouxa em uma missão perigosa, em que eles encontram velhos e novos animais fantásticos e entram em conflito com a crescente legião de seguidores de Grindelwald. Mas com tantas ameaças, quanto tempo poderá Dumbledore permanecer à margem do embate?
Animais nem tão fantásticos assim
Após as revelações e reviravoltas de seu antecessor, Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore parte de um ponto não muito distante dos eventos narrados no segundo filme, onde vemos o professor Alvo Dumbledore (Jude Law) em uma missão para deter o poderoso e maligno Gerardo Grindelwald (Mads Mikkelsen), que quer a todo custo assumir o controle do mundo mágico. Mas Dumbledore não pode fazer isso sozinho, afinal o pacto de sangue que ainda mantém com seu antigo companheiro o impede de agir contra ele.
É assim que Newt Scamander (Eddie Redmayne), a pedido do professor, entra em ação: acompanhado de um grupo bastante peculiar de aliados e seus queridos animais fantásticos, o magizoologista embarca em mais uma aventura desafiadora para vencer a ameaça de Grindelwald, enquanto a legião de seguidores do bruxo continua aumentando cada vez mais e instalando o medo no mundo mágico.
Como dito anteriormente, Os Segredos de Dumbledore é o filme mais competente da franquia até então. Claro que isso não significa que ele consiga ser muito eficaz naquilo que promete, mas já chegaremos lá. A mudança no tom é bastante perceptível, especialmente na condução da narrativa. Isso se dá exclusivamente por causa da participação e experiência do roteirista Steve Klove, que trouxe adições interessantes para a trama, enquanto auxiliou na resolução de problemas grotescos de Os Crimes de Grindelwald, por exemplo.
Entretanto, isso não foi suficiente para que o terceiro filme saísse da sombra dos anteriores. Apesar de arriscar uma atmosfera mais sombria e tentar trazer elementos que até poderiam se tornar algo relevante no futuro, todo o desenvolvimento da narrativa de Os Segredos de Dumbledore parece correr em círculos e não chega em lugar nenhum. Muitas vezes, as semelhanças com a estrutura de As Relíquias da Morte são tão gritantes que parecem amadoras, como se aquela fosse uma tentativa fracassada de repetir mais uma vez a dose de sucesso de Harry Potter.
Não ajuda que os personagens também não apresentem nenhum tipo de desenvolvimento relevante, fazendo com eles permaneçam petrificados na história. A relação de Newt com seu irmão Teseu (Callum Turner) é um claro exemplo, porque quando achamos que veremos algum avanço, parece que o filme retrocede. Não há muito interessado em mostrar isso ao público, evolução. Afinal, é mais fácil mostrar Hogwarts, enquanto a clássica trilha sonora de Harry Potter toca ao fundo, do que tentar algo original e que saia um pouco dessa nostalgia exacerbada.
O carismático Jacob Kowalski (Dan Fogler) talvez seja a maior exceção, já que, neste terceiro filme, continua crescendo cada vez mais no universo. Por outro lado, Queenie (Alison Sudol), Credence (Ezra Miller) e Tina (Katherine Waterston) são completamente desprovidos de um propósito minimamente interessante. Enquanto Tina nem ao menos é uma figura relevante para a trama, era de se esperar que Credence pelo menos ganhasse certo destaque no desenrolar da história. Mas não é isso que acontece, até porque, no meio de tantas reviravoltas mirabolantes, fica difícil estabelecer uma unidade competente.
O longa também utiliza como pano de fundo um enredo político que, em certos momentos, parece que vai ganhar força, só que não consegue sair da superfície. Algumas temáticas traçam brevemente um paralelo com a Segunda Guerra Mundial, o nazismo e como discursos de ódio acabam se infiltrando facilmente nas veias da sociedade, mas não há fôlego para um desenvolvimento maior.
É neste cenário que temos a personagem da brasileira Maria Fernanda Cândido, Vivência Santos, que infelizmente não ganha espaço o suficiente para que o público a conheça de fato. Sua presença se estende por poucas falas.
Por mais que os animais fantásticos que dão nome à franquia finalmente ganhem certa notoriedade e um propósito condizente com a trama, a sensação é de que ainda falta alguma coisa. A condução de David Yates, apesar dos avanços em comparação aos anteriores, apresenta mais inconsistências do que acertos, em um filme que parece ter medo de lidar com o bicho-papão que ele mesmo criou.
A complexidade de Alvo Dumbledore
Claro que, com um longa intitulado Os Segredos de Dumbledore, seria injusto não dedicar uma parte apenas para o poderoso bruxo. No meio de tantos problemas, é Alvo Dumbledore quem realmente brilha. A performance melancólica de Jude Law é um dos pontos mais interessantes do terceiro filme, assim como sua relação com Grindelwald, interpretado majestosamente por Mads Mikkelsen.
Vale destacar a forma como a presença de Mikkelsen transmite mais imponência e foge da versão caricata feita por Johnny Depp. O filme não está preocupado em explicar a troca de atores, mas é fato que ter alguém como Mads, um profissional extremamente versátil e talentoso, foi um dos principais acertos da franquia até agora. Nas mãos de Mikkelsen, Grindelwald se torna uma figura ainda mais misteriosa e ameaçadora, ao mesmo tempo que enxergamos aquele por quem Dumbledore se apaixonou.
Falando em Alvo, é aos poucos que seus “segredos” vão sendo abordados ao longo do filme. Por meio de alguns detalhes, notamos o quanto os acontecimentos de seu passado foram fundamentais para que ele se tornasse um dos bruxos mais poderosos do mundo mágico. Seja por não mencionar que tem um irmão ou por ainda guardar a tristeza e culpa pela morte da irmã, Dumbledore é alguém que não tem medo de rever suas próprias percepções e agir, se necessário.
Por isso que a forma como Jude Law conduz o personagem é satisfatória: ele consegue manter toda a postura do bruxo, mas ainda assim transmite toda a miríade de sentimentos que Alvo carrega consigo. A dor vinda de um amor avassalador e impossível ainda está arraigada em seu íntimo, tanto que ele hesita em confrontar aquele que pode destruir a paz que tanto preza. Em certos momentos, é quase como se ele se agarrasse ao pacto de sangue como uma segurança, um fio condutor que o leva de volta para o passado, quando ainda era jovem e tinha o desejo de mudar o mundo.
A última cena do filme foi capaz de resumir muito bem toda a complexidade ao redor de Alvo Dumbledore. Suas angústias, a solidão na qual ele se encontra e as dúvidas que ainda o atormentam são captadas por um único olhar. Por mais que a sequência tenha suas muitas falhas, ao menos conseguiu transmitir um pouco a grandiosidade de um dos personagens mais intrigantes deste universo.
Por fim, chegamos ao ponto onde o labirinto se torna cada vez mais complicado e, aparentemente, sem uma saída à vista. Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore tenta resolver os erros do seu passado, mas o Vira-Tempo já foi há muito perdido para que isso aconteça.
Existem momentos divertidos e nostálgicos que, com certeza, conseguem emocionar qualquer fã da franquia, mas ainda falta uma ousadia maior para que a história de Newt Scamander consiga alcançar aquilo que Harry Potter soube captar tão bem. Embora seja o melhor filme até o momento, a sensação que fica é a de que a saga segue andando em círculos, sem saber muito bem o que quer ser ou o que quer se tornar.
Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore estreia no dia 14 de abril de 2022 nos cinemas.
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