Como surgiu A Família Addams? A história de origem de uma das famílias mais icônicas da cultura pop
Como surgiu A Família Addams? A história de origem de uma das famílias mais icônicas da cultura pop
Ouviu isso? É o som dos dedos estalando!
Edgar Allan Poe, H. P. Lovecraft, Stephen King, Guillermo Del Toro, Jordan Peele. A lista de “mestres do macabro” é extensa, mas entre tantos nomes, apenas um foi capaz de criar a família mais grotesca e cativante do cinema, televisão e quadrinhos: Charles Addams. Fazendo 85 anos desde sua criação, é inegável o fato de que a Família Addams é uma das mais icônicas da cultura pop. Mas você sabe como ela surgiu?
Menos uma família, mais um grupo de estranhos
Lançada pela primeira vez em 1937 em uma edição do The New Yorker, a família Addams começou sua carreira como um grupo de indivíduos peculiares e sem nome. Assim como seus personagens, Charles Addams, cartunista e comediante, tinha uma fascinação pelo bizarro.
De acordo com algumas fontes, a personalidade de Charles era tão peculiar que sua coleção de objetos pessoais incluía uma série de atiradores de flechas e uma lápide como mesa de centro. Seu amor pelo excêntrico e macabro o levou a idealizar o que se chamaria mais tarde de A Família Addams.
Com ajuda de Ray Bradbury, autor de Fahrenheit 451, a ideia da família rica e sombria foi esboçada. As tiras publicadas pelo The New Yorker fizeram sucesso ao ponto de chamar a atenção da ABC nos anos 60.
“[…] Toda a coisa da família Addams pegou ele de surpresa. Especialmente porque ele nunca havia nomeado eles. Até o fim. Ele teve que nomear os personagens para a série, nos anos 60, porque não havia tato nomes a eles antes. Eles não diziam ‘Oh, olá, Mortícia, como está você?’. Nada disso estava nos cartuns. Eles não tinham nome e nem eram uma família. Às vezes ele os colocava juntos como uma família, mas eles eram indivíduos”, disse H. Kevin Miserocchi, diretor da fundação Tee & Charles Addams Foundation, para o site Hamptons.
Altos e baixos dos Addams
Exibida entre 1964 e 1966, A Família Addams estava longe de ser um sucesso. Mesmo com alguns mistérios sendo revelados na produção da ABC, como a entidade da “Coisa” mencionada nas tiras de Charles — essa sendo a “Mãozinha” — e a fidelidade estética com o material original, a série durou apenas duas temporadas.
Um dos motivos para a falta de audiência dos Addams tinha uma resposta: A Família Monstro. A série também lançada em 1964 tinha as mesmas peculiaridades dos Addams, mas se os personagens de Charles eram completamente originais, a Família Monstro se apoiava em rostos familiares.
Composto por cinco criaturas distintas, seus nomes poderiam ser novos, mas os aspectos físicos lembraram o monstro de Frankenstein, o Drácula e o Lobisomem. A obra de Addams podia ser um marco para a mídia jornalística da época, mas a Família Monstro foi mais facilmente assimilada pelo público.
Ironicamente, ambas também encontrariam o fim na mesma época, em 1966. Neste ano, outro personagem dos quadrinhos chegava à televisão, o Batman. Estrelada por Adam West, a produção se tornou a nova queridinha quando se tratava de humor bizarro e sem sentido.
Mas, isso não impediu que a família continuasse no imaginário popular. A personalidade agitada de Gomez, o olhar distante de Morticia, a curiosa mão servente dentro de uma caixa, além da icônica trilha sonora, tudo isso e mais contribuiu para os Addams retornarem mais tarde.
Mas por que o sucesso dos Addams?
Antes do retorno icônico, o mais importante a se questionar sobre a obra do cartunista é: Por que os Addams? Mesmo que as adaptações de Barry Sonnenfeld dos anos 90 tenham personagens carismáticos e, até mesmo, adoráveis, os Addams são tudo de repulsivo na sociedade.
A forma como Wandinha tortura o irmão, o jeito perturbador do Tio Chico, até as poções e maldições da Vovó Addams. Todas essas características deveriam ser motivos para que o público dos anos 60 os odiasse, certo?
E a resposta não é tão fácil quanto parece. O início da publicação da família Addams coincide com um momento sombrio da história. Isto porque, um ano mais tarde, em 1939, a Segunda Guerra Mundial reuniria diversos países contra um mesmo inimigo: o nazi-fascismo.
Ainda vale lembrar que os anos anteriores à guerra incluíram diversas crises e uma quebra de expectativa da família modelo americana. Em outras palavras, o “sonho americano” estava morrendo. Logo, como consumir uma produção sobre faroeste, dizendo que a América é um paraíso quando a economia está em pedaços após a crise de 1929?
A Família Addams surge nos quadrinhos da New Yorker como uma alternativa ao que não cabia mais à sociedade da época. Todo esse contexto se repete quando a série começa a ser exibida nos anos 60. Mesmo quinze anos após o fim da guerra, o mundo ainda convivia com o temor da chegada de um novo conflito.
Parafraseando Dilma, “não houve vencedores, nem perdedores” na guerra e o mundo sabia disso. Produções como Família Monstros e Família Addams são uma prova de como esses dois mundos estavam colidindo: o conservador, o modelo americano perfeito e a dura realidade do dia a dia. As duas séries são uma lição sobre como conviver com o “monstruoso”.
Com o decorrer dos anos, a necessidade desse choque de realidade se tornou ainda mais presente. Enquanto os quadrinhos dos Addams se mantiveram no New Yorker até 1988, ano da morte de Charles Addams, outras produções com ideais parecidos foram surgindo, como a animação Scooby-Doo e sua fascinação por descobrir o homem por trás da máscara do monstro.
Wandinha, cadê você?
O cachorro falante e os jovens enxeridos foram essenciais para o retorno dos Addams. Em 1972, a Hanna-Barbera decidiu reunir esses dois grupos curiosos em Scooby-Doo Encontra a Família Addams, também conhecido como Wandinha Está Desaparecida.
Nele, Scooby e sua turma são levados a tomar conta de Wandinha e Feioso para que Gomez e Morticia possam sair para uma segunda lua de mel. O problema é que Wandinha desaparece na assombrada propriedade dos Addams.
A animação foi o pontapé inicial para diversas outras adaptações surgirem. Dentre elas, um piloto cancelado em 1973, uma animação da Hanna-Barbera tomando os quadrinhos como base no mesmo ano, um especial de Halloween em 1977 e, por fim, os filmes dos anos 90. Desde então, os Addams tem ido e voltado para cinema e televisão, atingindo o teatro com musicais e chegando, por fim, a era dos streamings com Wandinha, série da Netflix.
Uma família tradicional, nuclear e macabra
Entre tantas histórias, o mais curioso na obra de Charles Addams é como seus personagens se mantiveram inalterados desde 1937, mas ainda assim contemporâneos. Mesmo nos quadrinhos e episódios mais obscuros dos Addams, temos uma crítica ao modelo tradicional de família e, até mesmo, a aspectos machistas da sociedade.
Gomez não é apenas um marido e pai amoroso, mas uma pessoa que parece questionar diversos atributos de uma masculinidade tóxica. Já Mortícia é um modelo de maternidade que foge de todas as expectativas do que é ser mãe.
Esse choque cultural vai além do humor ácido e atinge o que é a expectativa do tradicional com a realidade do ordinário. Assim como é constantemente dito em Wandinha, todos gostariam de ser como os Addams. Não pelo horror que envolve esta família, mas pelo dom de “não se importar com o que os outros pensam”. Charles Addams, assim como esses curiosos personagens, não parecia se importar e, por isso, sua criação está viva até hoje.
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