Review: Back 4 Blood é um shooter mediano que não escapa da sombra de Left 4 Dead
Review: Back 4 Blood é um shooter mediano que não escapa da sombra de Left 4 Dead
Game de zumbis tem uma base sólida que vai crescer com atualizações, mas sistemas desnecessários e falta de personalidade ainda pesam
Há algo mágico nos jogos da Valve Software. O estúdio norte-americano é conhecido por alguns dos maiores títulos do PC, com um enorme repertório de obras memoráveis e franquias de qualidade consistente ao longo de décadas. Entre Half-Life e Portal, uma das sagas que conquistou legião de fãs no final dos anos 2000 foram os jogos de Left 4 Dead.
Inspirados por filmes clássicos de zumbi, os games entregam excelentes experiências cooperativas para até quatro jogadores pelo apocalipse, frente à hordas e infectados especiais. O único problema? O último Left 4 Dead saiu há mais de uma década, em 2009. Parte da magia da Valve é justamente a falta de regularidade da empresa, que faz projetos novos – mas de altíssima qualidade – quando bem entendem. Isso significa esperar por décadas apenas pela possibilidade de uma continuação para sua franquia favorita.
Os desenvolvedores de Left 4 Dead preferiram não esperar. Anos após terem fundado o próprio estúdio chamado Turtle Rock, e terem tentado algo novo com o multiplayer assimétrico Evolve (2015), eles agora voltam para o gênero onde se consagraram com Back 4 Blood.
Ficha técnica
Título: Back 4 Blood
Desenvolvedora: Turtle Rock Studios
Distribuidora: Warner Bros.
Plataformas: Xbox One, Xbox Series X | S, PC, PlayStation 4, PlayStation 5
Lançamento: 8 de outubro de 2021
Gênero: Jogo de Tiro em Primeira Pessoa
Modo: Single-Player, Multiplayer cooperativo
Back 4 Blood é um ambientado em um mundo tomado pela infecção zumbi, e acompanha um grupo de quatro sobreviventes – chamados de Limpadores – que precisam fazer de tudo para se manterem vivos, em busca de uma forma de acabar com o apocalipse. Essa luta vai de cidades devastadas à florestas tomadas pelos mortos, e todo tipo de desgraça surge para atrapalhar a vida dos personagens, seja sobreviventes mesquinhos ou infectados especiais.
Se não ficou claro pelo título, o game é assumidamente moldado à imagem de Left 4 Dead – algo que, inclusive, foi muito utilizado pelo marketing. A comparação se torna absolutamente necessária, já que o jogo propõe ser uma evolução dos clássicos. A abordagem toda é pegar a base estabelecida pela Valve, e incrementá-la para ser mais compatível com as tendências atuais da indústria. A solução é uma via de mão dupla, com muito a ser celebrado, mas também várias decisões bastante duvidosas.
Por um lado, o sucesso de Back 4 Blood mostra a falta que fazia um jogo coop desse estilo. Reunir um grupo fechado é garantia de partidas surtadas e divertidas, com a imprevisibilidade das hordas criando momentos únicos até para os mais veteranos. O game também surpreende pelo vasto arsenal de rifles, submetralhadoras, pistolas e armas corpo-a-corpo, e uma é mais satisfatória de usar do que a outra.
Acertar um headshot em um zumbi desatento, ou então sair cortando por multidões com um machete, continuam sendo prazeres simples e poderosos. A Turtle Rock demonstra entender o que tornava a experiência tão satisfatória, com fases que seguem um bom ritmo entre momentos mais calmos e pontos caóticos. Ter que entregar suprimentos, ou então defender alguma área da invasão de hordas, continua altamente viciante, desafiador e divertido.
A experiência toda podia se sustentar na jogabilidade ser tão boa, especialmente se aproveitada ao lado de amigos. Mas tal qual uma pessoa ansiosa que não sabe exatamente quando parar de falar, Back 4 Blood tropeça pelo excesso.
É aterrorizante tocar em um clássico, especialmente um como Left 4 Dead, que mantém uma base de jogadores ativos de fazer inveja para muitos lançamentos por aí. Na tentativa de se destacar, a Turtle Rock apostou no que a indústria de games faz melhor: “inovar” a qualquer custo, ao invés de refinar o que já era bom.
O jogo é marcado por uma avalanche de sistemas que mais ofuscam a experiência original do que ajudam em algo. A escolha de seu personagem não é só estética, mas sim funciona como uma classe, com categorias de armas e habilidades próprias. Um deles consegue escapar de agarrões, enquanto outra pode curar aliados mais rapidamente, ou então recuperar as energias com mais facilidade.
Para complementar, além das categorias de armas serem atreladas a determinados personagens, os equipamentos contam com estatísticas próprias de dano, coice e velocidade, que podem ser melhoradas com peças adicionais – compradas tanto na loja in-game que surge nas salas seguras, ou então encontradas pelo mapa.
Nada disso muda drasticamente a jogabilidade, mas torna a experiência de Back 4 Blood mais cansativa. É o tipo de ideia que funciona bem no papel, mas que se traduz para as telas em tarefas para o jogador, que fica encarregado de criar uma build consistente. É bastante anticlimático estar cercado de mortos-vivos e ter que parar para ler letras miúdas e dados aleatórios, na tentativa de descobrir se um outro tipo de munição vai melhorar algo na sua arma.
Parte do apelo do apocalipse zumbi é que a sobrevivência é dificultada pela necessidade do improviso. O game vai contra essa ideia, e cria uma urgência artificial de que é preciso se preparar. Um acampamento de sobreviventes serve como hub ao melhor estilo Destiny, onde se customiza o seu equipamento antes de seguir para missões.
É aí que o principal diferencial de Back 4 Blood se torna um saco. Há grande ênfase em um sistema de cartas, com modificadores que podem ser ativados a cada nova rodada, como aumento de velocidade ou pontos de vida adicionais. Por si só as cartas não viram o jogo, mas podem ser combinadas para supostamente criar partidas únicas. Ao jogador casual, nada disso faz muita diferença, com leves modificações tão sutis que fazem questionar se toda a pressão que o game coloca nelas realmente importa.
O único momento em que uma boa build fará diferença é ao jogar na última dificuldade, que é notória por ser gratuitamente apelona na quantidade de inimigos e infectados especiais. Nesse caso, combinar itens de velocidade se tornam essenciais para finalizar os mapas ao estilo speedrun, mas isso só exemplifica como a obra pede para ser reduzida em um tedioso jogo de estatísticas previsíveis. É irônico que, com tantas funções de customização, sobre pouco espaço para improvisar e montar seu próprio estilo de jogo de acordo com a necessidade de cada fase.
Francamente, a base de Back 4 Blood é muito sólida pois se sustenta em ótima jogabilidade, divertida o bastante para entreter um grupo de amigos. Dessa forma, é possível aliviar muitos dos problemas atuais através de atualizações. É o caso das dificuldades que, em três opções, oferecem nada de desafio ou então missões completamente desbalanceadas. O fato de que o modo offline também não funciona direito, sem contar progresso para quem decide jogar sozinho, ou então o estranho sistema de saves que não registra direito seu progresso pela campanha, são todas frustrações que a Turtle Rock já prometeu melhorar no futuro.
Já os defeitos que parecem estruturais vão precisar de um pouco mais de esforço dos desenvolvedores. Quase tudo no game é sem graça, da campanha sem nenhum momento memorável, desse mundo completamente apático, ou então do grupo de personagens completamente irritantes. Ninguém tem carisma, mas todos tentam cuspir piadas e comentários engraçadinhos a todo momento.
Nem mesmo os infectados especiais sem salvam, com habilidades que parecem misturar um pouco a dos inimigos de Left 4 Dead, mas com aparência e sons completamente genéricos. No game da Valve, é possível identificar um Hunter ou um Smoker apenas pelos grunhidos. Aqui, todos compartilham o mesmo visual de pele cinzenta, com feridas vermelhas ou alaranjadas, como os (igualmente apagados) Swarm de Gears of War 4. Talvez seja até melhor só poder jogar com amigos, assim pelo menos fica mais fácil ignorar o quão estéril e sem sal a campanha é.
O problema de Back 4 Blood é querer complicar quando seu charme está justamente na simplicidade. Nessa busca ensandecida por se diferenciar de Left 4 Dead, a Turtle Rock criou diversos sistemas rasos, e se esqueceu de preencher o mundo, os sobreviventes, os infectados e as fases com algum respingo de personalidade. É possível se divertir bastante com o game, claro, mas isso fica a critério do jogador e de seu grupo de amigos – só é preciso ignorar a enorme quantidade de vídeos de tutorial que te aguardam a cada novo menu.
Ainda é possível que o jogo dê a volta por cima. De No Man’s Sky à Dead By Daylight, há uma extensa lista de títulos que só cresceram e melhoraram com atualizações. Se o estúdio souber valorizar os próprios acertos, corrigir os defeitos que a comunidade já apontou, e apostar em refinar a própria fórmula ao invés de inovações superficiais, Back 4 Blood pode se tornar uma dos melhores shooters cooperativos do momento.
Por enquanto não é o caso, e nessa longa estrada pela frente, sempre há a opção de tirar umas partidinhas de Left 4 Dead 2 para relembrar como se faz um apocalipse zumbi banhado em diversão, carisma e muito sangue de mortos-vivos.
NOTA: 7.5/10
A review de Back 4 Blood foi feita com base nas versões de Xbox One e do Xbox Cloud Gaming, que emula a versão de Xbox Series X do game.
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