Crítica: Invencível, Primeira Temporada
Crítica: Invencível, Primeira Temporada
Animação traz uma reflexão visceral sobre o peso do heroísmo
Vivemos em uma era onde histórias de super-heróis são a norma. Depois de anos assistindo filmes da Marvel, sabemos exatamente o que esperar dessas narrativas. E é exatamente com esse ponto comum que Invencível, a surpreendente animação da Amazon Prime Video, está contando para chocar o público e gerar reflexões sobre qual seria o verdadeiro peso de super-poderosos em nossa sociedade.
Ficha Técnica
Título: Invencível (Invincible)
Criação: Robert Kirkman
Direção: Jeff Allen, Paul Furminger e Robert Valley
Ano: 2021
Número de episódios: 8
Sinopse: Um adolescente descobre seus super-poderes e luta para alcançar o legado de seu pai, o mais super-herói da Terra.
Paradoxo do Superman
Na trama, acompanhamos a jornada de Mark Grayson, um adolescente filho do super-herói mais poderoso da Terra, o Omni-Man, que acabou de descobrir seus superpoderes. Enquanto tenta entender o seu caminho como o super-herói Invencível, ele enfrenta muitos dos problemas de um jovem adulto e acaba envolvido no mistério do assassinato de heróis renomados.
A figura central dessa temporada é seu pai, o Omni-Man — uma sátira inteligente do Superman, que explora questões inerentes ao personagem de formas que a DC jamais imaginou. Ao invés de tentar encontrar humanidade em um personagem basicamente sem defeitos, como acontece em praticamente todas as adaptações do Homem de Aço, Invencível decide que existem questões mais interessantes a serem discutidas.
O enredo não foge da onipotência inerente ao personagem. Pelo contrário, os roteiristas abraçaram a ideia de um poder supremo e mostraram os perigos de se concentrar autoridade em uma figura imbatível. Longe do bastião de moralidade que costumamos esperar, o personagem se enxerga com um distanciamento exagerado dos demais que encaixa como uma luva. Uma representação crível de como um super-herói inalcançável se portaria em um mundo incapaz de contê-lo.
Esse olhar mais cético e corajoso é evidenciado logo no primeiro episódio, quando a série escolhe matar o que conhecemos como super-heróis de forma bastante literal. Além de emblemática, essa cena dita o tom do restante da temporada, tanto no nível de violência que o público deveria esperar, quanto na torção das expectativas do gênero.
Atualização dos quadrinhos
Essa estratégia é uma herança direta dos quadrinhos de Robert Kirkman, que também atua como produtor da animação. A estrutura de sua história copia a estrutura bruta das histórias de super heróis tradicionais, usando de diferentes padrões do gênero, para criar uma sensação de comodidade do público que é sempre destruída brutalmente de maneira bastante criativa.
Em relação aos quadrinhos, a série animada é bastante diferente. Ela ainda segue os grandes acontecimentos que marcaram os leitores originais, mas o desenvolvimento e como estes eventos se ligam foi retrabalhado para funcionar melhor no meio audiovisual, ao mesmo tempo que atualiza o trabalho original para que se torne relevante nos tempos atuais. O envolvimento de Robert Kirkman neste processo foi crucial para manter a essência da série.
Outro elemento decisivo para solidificar essa transição das páginas para as telas foi o elenco estelar de dubladores da versão original. A Prime Video não poupou dinheiro na hora de contratar nomes estrondosos para o projeto. Só no núcleo principal da família de Mark temos Steve Yeun, de Walking Dead; Sandra Oh, de Grey’s Anatomy; e J.K. Simmons, o J. J. Jameson dos filmes do Homem-Aranha. Os personagens foram levemente modificados para refletir o elenco diverso de talentos.
Bruto, visceral e polêmico
A grande visceralidade de Robert Kirkman, também presente em The Walking Dead, marca presença em cada episódio da temporada. Todo sangue e as vísceras presentes no show não são usados a esmo e tem a função de realçar as sensações que a história pretende causar, principalmente o desconforto.
Parte do conceito da animação é, assim como The Last of Us Part II, tentar resgatar o impacto que a violência deveria ter. Cada soco de um super tem consequências bastante gráficas que não são glorificadas. Toda ação heroica impensada acaba gerando vítimas e não é confortável encarar suas entranhas. Este incômodo frisa a responsabilidade dos heróis diante de suas ações.
Fora da trama principal, que se divide entre a inexperiência do Invencível e a animosidade do Omni-Man, a animação faz um trabalho incrível de construir um elenco secundário interessante com tramas ricas que complementam bem o drama principal. O destaque vai para a Atom Eve, que tem um pequeno arco de emancipação que deixaria a Arlequina orgulhosa.
No quesito técnico, a animação é bastante fluida e não deixa nada a desejar. O desenho abusa de cores bem fortes que contrastam muito bem com o sangue sempre presente nas cenas de ação, tornando até as cenas mais turbulentas fáceis de entender.
O maior problema da série é o seu grande momento de revelação, a reviravolta final. Invencível passa a temporada inteira construindo o segredo do Omni-Man e suas enigmáticas motivações, mas em sua ânsia para inverter estereótipos, acaba estragando sua própria surpresa resultando em um momento ligeiramente anticlimático.
Depois que entendemos que os roteiristas tentam sempre chocar nos momentos de calmaria, a surpresa começa a perder um pouco o efeito e isso precisará ser resolvido nas futuras temporadas. Mas por ora, Invencível consegue conquistar o público ao trazer uma animação visceral, revigorante e cativante que te deixa pensando sobre o verdadeiro peso de um super-herói.
Descubra tudo sobre o Omni-Man, mas cuidado com spoilers: