O seu medo salvou Lucifer!
O seu medo salvou Lucifer!
“A gente só dá valor depois que perde…”
Todos nós já ouvimos alguém dizer, ou nós mesmos dissemos em algum momento da vida, para diversas situações diferentes o seguinte ditado:
“A gente só dá valor depois que perde…”
Seja um relacionamento que acabou, seja um amigo que se afastou, seja uma oportunidade que perdemos, ou seja uma série que acabou…
À princípio isso parece algo completamente negativo quando avaliamos no primeiro momento, mas e se os estúdios e emissoras se aproveitassem desse sentimento que temos, para dar uma completa virada em algo que não está funcionando muito bem?
Recentemente vimos o exemplo disso na prática, duas séries tidas como canceladas foram salvas, e nunca em sua história de anos de existência, elas estiveram tão relevantes como agora. Estamos falando de Brooklyn 99 e Lucifer.
Brooklyn 99 é uma excelente série de comédia da Fox, que após 5 temporadas, sem ganhar muito destaque no diálogo público, sem criar grande alarde em momento nenhum, sem receber o devido reconhecimento que merecia, ela veio a ser cancelada. Isso gerou uma comoção mundial de pessoas indignadas, o que acarretou na notícia que a NBC salvaria a série.
Lucifer foi outra vítima da Fox. Depois de 3 temporadas de baixa audiência, a série não viu um futuro na emissora, o que mais uma vez trouxe uma comoção mundial, até mesmo com o elenco da série clamando para que a mesma fosse salva, como aconteceu com B99, e pediam para que as pessoas fizessem barulho nas redes sociais com a hashtag #SaveLucifer (biblicamente irônico, eu sei). E qual foi o resultado? A Netflix veio para salvar a pátria e agora a 4ª temporada da série se passará no serviço de streaming.
Mas isso não se restringe apenas aos acontecimentos mais recentes. Devemos te lembrar do que aconteceu com Constantine? Mesmo que a série solo não tenha sido salva, o personagem interpretado por Matt Ryan, que nos primeiros episódios era muito criticado, hoje é completamente ovacionado, tendo garantido até mesmo seu lugar como um personagem fixo na próxima temporada de Legends of Tomorrow.
Firefly? Te lembra algo? Uma série com pouquíssimos episódios, que não deu muita audiência, mas o fato de ter sido cancelada trouxe um status quo de ícone cult para a série, e transformou Nathan Fillion em um ícone da cultura pop. Ou seja, o poder da perda pode transformar as coisas, e transformar o sentimento das pessoas de uma maneira que elas nem conseguem perceber como aconteceu, e eu vou explicar mais ou menos o motivo disso ocorrer, e como isso é explorado de uma maneira que você nem vê acontecendo.
Uma pesquisa realizada por Amos Tversky, um dos maiores pioneiros da ciência cognitiva, já mostrou que o nosso cérebro responde melhor e de maneira mais eficiente, já que o sentimento de perda é muito mais impactante no nosso cérebro do que o sentimento de ganho. Da mesma maneira, nosso cérebro sempre reagirá de maneira positiva ao sentimento de recompensa.
Ou seja, o que acontece nestes casos, é que à partir do momento em que sabemos que uma série que acompanhamos será cancelada, mesmo se ela não for algo que sejamos tão fãs assim, nós nos agarramos à esta série como se ela fosse a mais importante de todas. Mas mais importante do que isso, em ambos exemplos de Brooklyn 99 e Lucifer, um fenômeno curioso e previsível aconteceu, ambas as séries entraram para o status de “trending”, pois juntamente com o clamor dos fãs para não perderem suas séries, veio a comoção daqueles que jamais as viram, sempre ficaram postergando a oportunidade de ver, e quando o anúncio do cancelamento veio, juntamente veio o sentimento de “Eu devia ter dado valor à série quando ela ainda estava passando”, isso fez com que muitas pessoas começassem a ver a série após o seu cancelamento.
O sentimento de perda, somado com o a necessidade do ser humano de pertencer à alguma coisa – neste caso, pertencer à grande massa que clama pelo salvamento da série ao mesmo tempo que esbraveja nas redes sociais por tais cancelamentos – faz com que outras emissoras e estúdios vejam uma grande oportunidade aqui.
Séries que eram consideradas “irrelevantes” agora adquiriram um novo status, o patamar de algo que não estamos prontos para deixar ir embora, se tornaram relevantes, tudo que envolve o universo destas séries agora dá audiência, e nós já dissemos que a resposta do cérebro para o sentimento de recompensa é sempre positiva, é o espaço perfeito para a figura do herói.
Eis que – nestes dois casos específicos – entram a NBC e a Netflix, preenchendo esta lacuna, salvando a vida daquela figura que os fãs não estão prontos para ver morrer, abraçando estas séries que à partir de agora, independentemente de onde sejam exibidas, já serão um sucesso garantido, e conquistando os corações de todos os fãs, os antigos e os mais recentes, que estão completamente agradecidos à estas duas emissoras, sem que percebamos que na verdade estamos dizendo “Obrigado por permitirem que agora eu dê dinheiro e audiência para vocês.”
Não se enganem, a Netflix poderia ter anunciado que iria salvar Lucifer muito antes do que quando aconteceu, mas se tratando dos gigantes do marketing que eles são, definitivamente eles preferiram esperar um pouco, esperar o sentimento de perda nos seus corações aumentar, para que quando o anúncio fosse feito, acontecesse a comoção geral que realmente aconteceu.
Decisões de marketing são tomadas baseadas nos comportamentos das pessoas, que acreditem, são mais previsíveis do que vocês imaginam. Mas não se achem menores por isso, se alguém salvou Lucifer, ou Brooklyn 99, esse alguém foi você, e o seu medo primitivo que nasce nas camadas mais internas do seu cérebro…
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