Como o medo do desconhecido é trabalhado em Silent Hill!
Como o medo do desconhecido é trabalhado em Silent Hill!
Quase vinte anos de Silent Hill e até hoje aprendemos, e muito, com a franquia sobre o que é medo.
Dia 31 de janeiro de 2019. A saga de jogos Silent Hill fará vinte anos de seu lançamento. O jogo que estreou em 1999, chegou a ser esperado como fracasso por veículos de mídia especializado na época, pois Resident Evil tinha acabado de ser apresentado e sido um grande sucesso. Contudo o jogo saiu e foi um sucesso sem outro igual e o grande motivo para isso é que mesmo estando no mesmo gênero que o famoso jogo de zumbis, ele abordava o medo de maneira diferente.
Enquanto o jogo da equipe de elite apresentava cenários sombrios, onde cada esquina você tinha certeza que poderia ter um zumbi, em Silent Hill as coisas eram diferentes, você simplesmente não sabia o que te aguardava após cada tela de carregamento. O jogo se utilizou de suas limitações técnicas para apresentar uma atmosfera única que aumenta a tensão criada e mais se direciona a essa forma de medo.
Existem diversas formas de medo, e ambientes específicos geram respostas diferentes ao medo, nem todos nós temos medo de altura, já com isso podemos observar que o medo é muito único para cada um. O medo do desconhecido é muito comum na história da humanidade, por não entender ou ter conhecimento sobre o que está acontecendo geramos o medo pela falta de controle.
Uma das formas que o jogo se utiliza para apresentar o medo é devido a uma dificuldade técnica, a famosa névoa que cerca a cidade, nada mais é do que uma dificuldade de renderização que o console tinha na época. Para que não ficasse à vista os produtores preferiram colocar uma densa névoa, contudo isso gerou algo muito similar ao medo do escuro.
Quando estamos no completo escuro nos sentimos perdidos, a falta de um referencial gera essa sensação, no jogo isso acontece com frequência, além de na época não ter a popularização dos minimapas, caso você não explore o suficiente o local que se encontra, ficará sem mapa. Outro elemento bem utilizado no jogo é a iluminação, logo no início você recebe uma lanterna, o que te dá uma sensação de segurança, contudo no desenrolar do jogo você irá perceber que a lanterna atrai os monstros e se verá na encruzilhada entre andar às cegas e diminuir a chance de ser atacado, ou se apegar a lanterna e se tornar um alvo.
O medo está relacionado com sensações e é necessário trabalhar elas massivamente para criar uma verdadeira experiência de medo, qualquer falta de observação aos detalhes irá esvaziar completamente o clima que é criado. E é por isso que é tão difícil trabalhar com esse tipo de sentimento, principalmente em um jogo que tem diversas mecânicas necessárias ao tipo de mídia, mas que precisam ser adequadas da maneira correta a proposta do medo.
Um elemento por exemplo bem apresentado nos primeiros jogos da franquia, é a dificuldade em coordenar o personagem, muitas pessoas dizem que é uma má programação, porém alguns críticos acreditam que é uma técnica para causar fragilidade ao personagem. Mesmo que você tenha uma arma, a munição é pouca e não é certo que você irá conseguir acertar o monstro que está vindo em sua direção.
Apenas no jogo Homecoming que temos um personagem com treinamento militar, antes disso todos eram pessoas comuns, como eu e você, o que não faria muito sentido se você entrega um exímio atirador. E com isso também se perde o foco do jogo de sobrevivência ao terror, se você passa a poder matar todos os inimigos na bala.
Depois de analisarmos todas essas formas de trabalhar o terror, vamos ao medo do desconhecido, o medo do desconhecido na série é trabalhado fortemente dentro da narrativa, a todo tempo não sabemos o que está acontecendo.
O medo do desconhecido deixa o jogador em uma constante tensão, e como ele faz isso? Com alguns elementos que eu apresentei antes, a quantidade pequena de itens, a inabilidade do personagem em lutar, a lanterna que atrai os monstros. Tudo isso coloca o jogador em um papel desempoderado, onde sim ele tem o poder de lutar, porém o jogo desaconselha essa opção ao dificultar em muito isso.
Outra questão interessante, é que em muitas histórias famosas os personagens principais vão atrás do problema, eles se colocam na situação que o aterroriza, contudo em muitos jogos de Silent Hill os personagens são levados a cidade, não por opção, não por saberem ocorre lá e sim por vontade da cidade e de seus poderes malignos.
O jogo se apresenta quase como um episódio de Twin Peaks, onde a subjetividade e a realidade se misturam com frequência, focando no primeiro jogo da série, quando a cidade se transforma na sua versão alternativa o personagem fica extremamente perdido. No decorrer da história ele encontra algumas pessoas que falam coisas tão absurdas que não servem de explicação nenhuma, até que o véu cai e a narrativa é exposta e tudo passa a fazer sentido.
A abstração do medo é fortemente trabalhada no jogo, as representações dos monstros estão intimamente ligadas a questões psicológicas dos personagens que estão sendo afetados pela cidade. Essa influência sobre a realidade acaba sendo de uma morbidez tamanha, que após horas jogando Silent Hill existe uma necessidade de encher sua mente com algo mais leve, para fazer uma espécie de lavagem e tirar a mácula que é impregnada pela atmosfera do jogo.
Seria possível apresentar textos e mais textos sobre toda a genialidade que envolve o jogo, tudo que é apresentado foi cuidadosamente pensado, para que nos mínimos detalhes exista um impacto ao jogador. O trabalho artístico por trás do jogo é de um cuidado enorme, pois se qualquer elemento fosse mal colocado poderia quebrar toda a atmosfera proposta para o enredo o que seria um enorme problema.
Silent Hill se consagrou no universo dos jogos pela sua inteligência em utilizar problemas do console para entregar a atmosfera proposta, sabe usar muito bem elementos da psicologia para criar dentro do jogador um estado de tensão tão grande a ponto do silêncio se tornar extremamente desconfortável, e uma sala vazia ser assustador. Um jogo que veio aos jogos para nos ensinar muito sobre o medo, e como o ser humano lida com ele.
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